sábado, 28 de julho de 2007

AMOR DE PAI, FAGUNDES VARELA

Alguns versos do poema Cântico do Calvário

(À memória de meu filho
morto a 11 de dezembro de 1863)

Eras na vida a pomba predileta

Que sobre um mar de angústias conduzia

O ramo da esperança. Eras a estrela

Que entre as névoas do inverno cintilava

Apontando o caminho ao pegureiro.
Eras a messe de um dourado estio.
Eras o idílio de um amor sublime.

Eras a glória, a inspiração, a pátria,

O porvir de teu pai! Ah! no entanto,

Pomba, varou-te a flecha do destino!

Astro, engoliu-te o temporal do norte!

Teto, caíste! Crença, já não vives!

Oh! filho de minh'alma! Última rosa

Que neste solo ingrato vicejava!

Minha esperança amargamente doce!
Quando as garças vierem do ocidente

Buscando um novo clima onde pousarem,
Não mais te embalarei sobre os joelhos,

Nem de teus olhos no cerúleo brilho

Acharei um consolo a meus tormentos!

Não mais invocarei a musa errante
Nesses retiros onde cada folha
Era um polido espelho de esmeralda

Que refletia os fugitivos quadros

Dos suspirados tempos que se foram!

Cegou-me tanta luz! Errei, fui homem!

E de meu erro a punição cruenta

Na mesma glória que elevou-me aos astros,

Chorando aos pés da cruz, hoje padeço!
Oh! quantos reis que a humanidade aviltam,

E o gênio esmagam dos soberbos tronos,

Trocariam a púrpura romana

Por um verso, uma nota, um som apenas
Dos fecundos poemas que inspiraste!
Inda te vejo pelas noites minhas,

Em meus dias sem luz vejo-te ainda,

Creio-te vivo, e morto te pranteio! ...


FAGUNDES VARELA (1841 - 1875)

Nenhum comentário: