terça-feira, 26 de outubro de 2010

FARSAS E MENTIRAS

MITOMANIA

Outro advogado competente era o velho Margarido, especialista em técnicas de mediação, conciliação e arbitragem empresarial, que entretanto era mitômano e se dizia amigo de Gabriel García Márquez.

Gabito

- Conheci o Gabriel em Nova York, em 1962. Encontrava-me com ele e sua mulher, a Mercedes, nos bares do Central Parque, onde bebíamos uísque com soda e conversávamos sobre literatura. Naqueles tempos, Gabito, era assim que o chamávamos, estava muito entusiasmado com a carreira do romance “Ninguém Escreve ao Coronel” e certa vez me mostrou os originais da primeira parte dos “Cem Anos de Solidão”.


Sabíamos que essa intimidade com o escritor não era verdadeira porque a própria mulher do Margarido garantira numa festa que o marido nunca tinha viajado para fora do Brasil. Um dia alguém decidiu conferir e leu uma volumosa biografia do autor colombiano: García Márquez, realmente, é tratado pelos amigos como Gabito, morava em Nova York em 1962 e publicou “Ninguém Escreve ao Coronel” em 1961. E, de fato, sua mulher se chama Mercedes.
Explicou-me certa vez um psicanalista que a mitomania é uma inclinação compulsiva para a mentira, voluntária e consciente, sendo certo que não é pelas circunstâncias que os mitômanos se deixam apanhar.

- Neles se desenvolve a arte de revestir a fantasia com cuidado total, inviabilizando possíveis contradições e desmentidos.

Um dia Margarido limpou as gavetas e foi embora, deixando sobre a mesa uma carta em que informava que andava muito cansado. Nunca mais apareceu. Surpresas assim provavam o acerto de ter um profissional titular e outro em treinamento, exercendo a mesma função, o que certamente implicava aumento de custos, mas nunca descumprimos nenhuma tarefa por falta de gente qualificada.



- Tudo que sinto é cansaço.

MEGALOMANIA

Minha atuação me dava mais visibilidade do que poderia imaginar e, com o passar dos anos, fui adquirindo prestígio dentro da organização. Até que, um dia, o Board of Directors, que tudo dirigia lá de Nova York, decidiu promover-me a diretor técnico de todas as atividades na América do Sul. Um salto espetacular, que nunca passara, nem de leve, pelas minhas cogitações. Achei bom, claro, e bom continuaria se o acesso às informações que passei a ter na nova função não me fizesse ver que o mar era mais alvoroçado do que supunha, tendendo para o tempestuoso.
A WED era muito grande e cheia de possibilidades, mas nela percebia imperfeições, que, entretanto, não impediam grande geração de lucros e abundantes distribuições de dividendos para os acionistas. Tenho para mim que os defeitos são absorvidos se o projeto é vitorioso e, se muito vitorioso, não são sequer percebidos.
Também é verdade que os chefes de divisão inventavam trabalho uns para os outros, tanto quanto cresciam geometricamente os cargos de confiança, não importando se a organização estava progredindo, estabilizada ou em declínio, aplicando-se na plenitude os desígnios da lei de Parkinson. Mas a ação inocente, de mera decantação de processos autônomos a se diluírem no exercício da burocracia, terminava por aí, pois havia uma clara guerra de interesses e permanentes exercícios de bajulação. Alguns chefes de departamento trabalhavam exaustivamente, e por todos os meios, para assumir alguma posição na direção central. A qual se enchia de gente mais estúpida que o vice-presidente, Sean Forthwhite, de modo que este permanecia sempre como o mais inteligente do seu círculo.

- Sua ideia é absolutamente genial...

Cheio de iniciativas esdrúxulas, Forthwhite tinha poder suficiente para levá-las adiante. Amanhecesse com uma sugestão, impraticável que fosse ou estapafúrdia, todo o sistema se ajustava para provar que se tratava de uma ideia absolutamente pertinente e inovadora; a materialidade da proposta passava ao controle dos chefes de departamento, que imediatamente geravam curvas estranhas em que a moeda era energizada em todas as contas por índices de utilidades que multiplicavam os retornos esperados e reduziam os custos exigidos pelo projeto.

- Estamos aplicando os conceitos de Daniel Bernoulli.

Infelizmente, porém, esses torneios generosos não costumam ser acolhidos pela realidade das condições de campo. Cumpre-se então a derrota inevitável. Após a execução do projeto, que jamais poderia dar certo por sua frágil concepção e superficialidade, começava a busca dos que deveriam ser escalados para assumir a responsabilidade pelo fracasso.

Daniel Bernoulli

- Frustrou-se o êxito da operação, ora essa, por causa da incúria desses incompetentes, sabotadores morais, que não souberam implementar uma ideia revolucionária do vice-presidente. Uma ideia absolutamente revolucionária!

Assim se perderam algumas dezenas de milhões de dólares, jogados fora em projetos que não tinham nenhuma probabilidade de êxito. No início não me envolvi diretamente nessas aventuras, por serem iniciativas isoladas da WED na área de energia, fora do departamento de mineração. Mas, agora, como diretor técnico de todas as atividades, passei a vetar as iniciativas esdrúxulas, sem resistência da parte de Forthwhite, que temia contestar-me, dado o prestígio que me havia sido conferido por Nova York.

sábado, 23 de outubro de 2010

QUE EU NÃO TENHA VIVIDO EM VÃO

TYCHO BRAHE

A teoria heliocêntrica de Copérnico, apresentada na primeira metade do século XVI, revogava a ideia da centralidade e fixidez da Terra, mantendo, porém, a concepção de um mundo supralunar imutável, constituído pela “quinta essência”, um elemento diferente de água, ar, terra e fogo, existentes na Terra. Também não alterava o dogma dos movimentos planetários circulares e uniformes.
Outros conhecimentos e descobertas seriam ainda necessários para complementar a revolução copernicana, eliminando de modo cabal as concepções de Aristóteles. A primeira grande contribuição para isso foi dada por Tycho Brahe, por suas observações que feriam a reputação do sistema supralunar incorruptível e pelos dados astronômicos que colheu com precisão meticulosa, ensejando a Johannes Kepler a oportunidade de estabelecer as leis dos movimentos planetários.

Seria um novo planeta?

Tycho Brahe

Nascido em uma família rica da Dinamarca, Tycho Brahe (1546-1601) aos treze anos foi enviado para a Universidade de Copenhague e aos dezesseis, para a Universidade de Leipizig, antes de passar pelas universidades de Rostok e Basileia. Em 1566, com vinte anos, por causa de uma disputa intelectual, envolveu-se num duelo com seu primo Manderup Parsberg, do qual saiu sem um pedaço do nariz, que foi substituído por uma prótese de metal, que escondia perfeitamente a parte mutilada.
A família o queria estudando leis. Cedo, porém, Tycho adquiriu gosto pela astronomia, depois que, em 1560, com apenas 14 anos, observou um eclipse parcial do Sol. Da observação dos astros, passou à medida de suas distâncias, sempre com esmero e precisão.
Tycho Brahe tornou-se conhecido por causa de uma estrela supernova, que observou em 11 de novembro de 1572.
A "estrela de Tycho Brahe", como ficou conhecida, foi observada por astrônomos e sábios de toda a Europa até março de 1574, quando desapareceu.

- Seria um meteoro? Seria um novo planeta?

Feitas todas as verificações, constatou-se que era uma "estrela nova", conforme denominação que recebeu do próprio Tycho Brahe, num livreto, de 1573, a que deu o título de "De nova stella".
Naquela época não se tinha nenhuma explicação para uma supernova, nem havia conhecimento suficiente para fazer alguma hipótese a esse respeito. Seu aparecimento, contudo, derrubava a premissa de Aristóteles de que o mundo supralunar era imutável, ou, como afirmava, "incorruptível."

- Como imutável, se nele podia surgir uma supernova?

O que é uma supernova?

SN 2006gy: a maior supernova observada

A maior parte da matéria do Universo consiste de hidrogênio, que se reúne em grande quantidade para formar as estrelas. Numa temperatura muito elevada, quatro átomos de hidrogênio fundem-se num átomo de hélio, liberando energia. É o que ocorre no núcleo das estrelas, onde de início se produz hélio, seguindo-se com o tempo a produção dos outros elementos, como carbono e oxigênio.
Nesse pr
ocesso, a massa da estrela é puxada da periferia para seu centro, devido à atração gravitacional, que é contrabalançada pela pressão exercida do centro para a periferia em decorrência das altas temperaturas no núcleo da estrela, onde vai se dando a fusão dos elementos.
Um equilíbrio que se rompe depois de alguns bilhões de anos.
Pois, perdendo energia por irradiação de calor, a estrela entra finalmente num estágio de degeneração e acaba explodindo, quando suas camadas externas são ejetadas a milhares de quilômetros por segundo. O resultado é um gigantesco objeto luminoso, chamado de estrela supernova, que, sozinha, pode brilhar, durante um curto espaço de tempo, com intensidade maior que uma galáxia de bilhões de estrelas.
A estrela vista por Tycho sempre esteve lá, mas só se tornou grande e suficientemente luminosa quando se tornou uma supernova.

Cometa

Em 1577, um cometa de longa cauda apareceu no firmamento. Brahe demonstrou, com provas, que o astro passava a uma distância mais que seis vezes a distância entre a Terra e a Lua, atravessando as supostas esferas invisíveis, numa nova contradição com a premissa de um mundo supralunar, divinal e imutável.

Castelo do Céu

Uraniborg

Em 1576, Tycho Brae recebeu de presente de Frederico II, rei da Dinamarca, a ilha de Hven, onde construiu um observatório, Uraniborg (Castelo do Céu), no qual fez uso de uma variedade de instrumentos (quadrantes, rodas, sextantes e esferas amilares rotativas), para perscrutar o céu. Construiu adicionalmente uma instalação subterrânea, para guardar os instrumentos, além de biblioteca, gráfica, laboratório de alquimia, fornalha e prisão para servos relapsos.
Uraniborg cresceu a ponto de tornar-se uma cidade, enquanto Tycho elevava a astronomia observacional a um estágio sem precedente, advindo-lhe em consequência enorme reputação internacional.

Encontro com Kepler

Em 1588, com a morte de Frederico II, Tycho Brahe perdeu o financiamento de suas atividades, sua casa e posição. Só em 1597 mudou-se para Praga, onde chegou carregando seus instrumentos, ficando sob a proteção do imperador Rodolfo II. Foi lá que contratou como assistente o astrônomo alemão Johannes Kepler, a quem, antes de morrer, em 1601, confiou todos os seus dados sobre as estrelas e um cuidadoso trabalho sobre o planeta Marte.
No leito de morte, Brahe repetiu várias vezes para Kepler:

- Que eu não tenha vivido em vão.

Realmente não viveu em vão, pois, trabalhando com os dados de Tycho Brahe, Kepler iria derrubar a premissa dos movimentos circulares e uniformes, ao publicar em 1609 o livro "A Astronomia Nova", com as três leis dos movimentos planetários.

Sistema de Tycho Brahe

Sistema de Tycho Brahe ou geo-heliocêntrico
Lua e Sol em torno da Terra; os outros planetas, em torno do Sol


Cabe registrar que Brahe não aderiu ao sistema heliocêntrico, apesar de possuir um exemplar do "De Revolutionibus Orbium Coelestium" e de ser receptivo às ideias de Copérnico. Não conseguia imaginar uma explicação para a gravidade sem a centralidade e fixidez da Terra, nem aceitava nenhuma solução que contrariasse as Escrituras. Foi por isso que concebeu um sistema híbrido, esdrúxulo, que alguns chamam de geo-heliocêntrico: a Terra fixa, no centro, com o Sol e a Lua girando em seu redor; todos os planetas, exceto a Terra, girando em torno do Sol.
O sistema geo-heliocêntrico, que
chegou a ter boa aceitação, na época, lembrava o de Heraclides do Ponto (que considerava Vênus e Mercúrio girando em torno do Sol e tudo o mais girando em torno da Terra).
Seja como for, a importância de Tycho Brahe está nos dados que obteve e nas observações da supernova e do cometa de 1577, que contribuíram para demonstrar a inexistência do mundo supralunar divinal e, pelos dados que serviram a Kepler, o erro de considerar os planetas dotados de movimentos circulares uniformes.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

COMO PERDI DOIS ASSESSORES

A GRANDE TACADA


Meu principal assistente na WED era um jovem advogado de nome Yorick, que me ajudava na elaboração dos contratos, pois tinha boa redação e falava vários idiomas. Um dia, porém, alguém convenceu-o de que havia uma maneira fácil de ganhar dinheiro. Foi uma história curiosa e cheia de consequências.

- Digamos que você venda uma quantidade de ações da Petrobras por 100, comprometendo-se a entregá-las apenas numa data futura; depois, a ação caindo, antes da data futura acordada você recompra igual quantidade por 40, por exemplo; como você vendeu e comprou a mesma posição, está zerado e não precisa entregar nada. Um jogo, de créditos e débitos, onde não entram ações, que estas não interessam, mas apenas suas cotações. Mas há um troco de 60, entendeu?

- Troco de 60?

- O qual é tutu, generoso e fecundo, no bolso da criança!

- Mas as ações da Petrobras vão cair?

- Sem nenhuma dúvida, Yorick, pois sei de fonte limpa que o balanço anual, no fim do mês, virá muito aquém da expectativa do mercado. Balanço ruim, as cotações correrão para baixo, uma tacada de mestre!

Yorick não tinha nenhuma familiaridade com esses torneios vitoriosos da Bolsa de Valores, mas compreendeu a operação. Ouvira falar vagamente de mercado futuro e de gente que ganhou fortunas com esse tipo de especulação e acabou acreditando que aquela era a sua vez. Se tinha uma informação privilegiada, era usá-la para ganhar muito dinheiro.

- Por que você vai se meter nisso?

- Porque também sou filho de Deus.

Reuniu todas as suas disponibilidades, além de recorrer a empréstimos bancários, para fazer a margem, que era a garantia exigida na operação. Foi assim que procurou uma corretora de valores e negociou os maiores lotes que lhe permitiam seus recursos, pois, se lhe cabia entrar nesse negócio, que fosse de maneira decisiva. Ganhar o dinheiro da minha vida, pensou, e casar com a Valentina, pois não me recusará, como antes, quando o cidadão aqui não era um milionário.

- Ela me disse que jamais se casará com um pretendente que tem de trabalhar para sobreviver.

Restou-lhe, depois, aguardar, e Yorick foi acompanhando, ansioso, a evolução do mercado pelos jornais. As ações da Petrobras, como previsto, começaram a cair devagarinho, que a informação sub-reptícia vai se alastrando, insidiosa, de modo que os avisados, cada vez em maior número, vão se livrando do papel. Se há muita oferta, os preços desabam, eis uma lei inexorável, presente em todos os mercados, seja de ações, seja de pés de alface ou de pinguins de geladeira.

- So far, so good, pensou Yorick, satisfeito.

Quando afinal o balanço fosse publicado e a desvalorização chegasse ao máximo, recompraria os lotes vendidos para auferir o lucro da sua vida.

A geometria
A geometria, que é anterior ao homem, nos mostra que o quadrado de uma hipotenusa é soma de dois quadrados, sempre, sempre, antes do Big Bang, na época de Empédocles de Agrigento, nos dias atuais e eternidade adentro. Uma propriedade assegurada por catetos submissos e providenciais, cujos quadrados somam o resultado desejado, qualquer que seja a hipotenusa, não importa se carismática, excitada ou oligofrênica.

- Por que se pode afirmar isso?

- Porque a geometria garantidamente não falha!

- E o resto?

- Bem, o resto é o resto, como a capivara, que não tem nenhuma garantia.

Pois é, o inesperado aconteceu. Uma semana antes da publicação do balanço, veio o anúncio inesperado de uma descoberta de petróleo na Bacia de Campos, triplicando as reservas nacionais de hidrocarbonetos. As ações da Petrobras, ao invés de continuar caindo, dispararam na Bolsa de São Paulo, tanto quanto em Wall Street e Buenos Aires. Nunca tinha havido uma escalada tão espetacular nas cotações do papel. Ou seja, no caso do Yorick a tacada funcionou ao contrário. Viu-se obrigado a recomprar os lotes comprometidos pelo dobro do crédito gerado na operação, realizando, no frigir dos ovos, um prejuízo de 112,5 por cento, para zerar sua posição. Por isso tinham exigido todas aquelas garantias! Perdeu na empreitada tudo o que possuía, foi demitido a pedido, para receber indenizações trabalhistas, e desapareceu para sempre.

Sofia, a mulher que voou

Sem Yorick, lembro-me de ter admitido uma assistente, Sofia, que falava inglês fluentemente, sabia tudo de informática e era admirada por sua beleza excepcional. Nela enxergava apenas a excelente profissional, pois amava Cecília, que me bastava, e não tinha olhos para nenhuma outra mulher. A assistente mostrou-se de grande valia na redação dos textos e na formulação de cláusulas alternativas, sugerindo caminhos inovadores, que serviam ao êxito das negociações. Juntando-se a isto sua rara beleza, não era sem razão o sucesso que fazia. Fui percebendo que alguns negociadores estrangeiros visitavam-nos mais vezes que o necessário, sob pretexto de esclarecer cláusulas contratuais, só para ter contato com ela. Um deles, Chuck Birdwise, chegou a confidenciar para um geólogo da WED que se casaria com ela, se ela assim quisesse.

- Isso foi o bastante. Sofia pediu demissão da WED, casou-se com o estrangeiro e mudou-se para Nova York.

sábado, 16 de outubro de 2010

AFIRMAÇÕES TEMERÁRIAS

OURO NAS ESTRELAS

"Cada qual cuide de seu enterro, impossível não há."
(Quincas Berro D'água)


Nebulosa Carina
(Telescópio Hubble, 2009)


Em seu "Curso de Filosofia Positiva", escrito entre 1830 e 1842, Augusto Comte (1798-1857) manifestou a opinião de que nunca seríamos capazes de estudar a estrutura química e mineralógica das estrelas. Poderíamos conhecer, se tanto, seus movimentos, distâncias e características geométricas, como volume, forma e tamanho.

- Comte subestimou a ciência.

Augusto Comte

Em 1859, dois anos após a morte de Comte, os alemães Robert Bunsen e Gustav Kirchoff inventaram um instrumento que recebeu o nome de espectroscópio, capaz de decompor a luz proveniente das estrelas nas suas cores e projetá-las numa figura característica. A cada cor corresponde um comprimento de onda, sendo a luz da estrela uma mistura de muitas cores, isto é, de suas ondas de luz individuais.

Gustav Kirchoff e Robert Bunsen

O espectroscópio faz com a luz de qualquer estrela uma decomposição parecida com a decomposição da luz do Sol pelas gotas de chuva, no tão familiar fenômeno do arco-íris.
Cada estrela tem sua luz, e portanto o seu particular espectro de luz, que depende apenas da sua composição química. Como se fosse uma impressão digital ou um código de barras, que se chama de “linhas de Fraunhofer”; basta ter as linhas de Fraunhofer da estrela para conhecer inteiramente a sua constituição química e minerológica.


- Isto é, podem ser obtidas de forma prática e até corriqueira as informações que Comte considerou fora do nosso alcance para sempre!

Joseph von Fraunhofer

As estrelas estão a distâncias espetaculares, mas sua luz é a mensagem que nos enviam sobre sua composição química detalhada. Ficamos sabemos desse modo que elas são feitas dos mesmos materiais existentes na Terra.

- As linhas de Fraunhofer de uma estrela também nos informam sobre sua temperatura, pressão e tamanho.


Devemos notar, porém, que a espectrografia não se presta para conhecer a composição química, nem qualquer outro dado, da Lua ou dos planetas, que são astros iluminados e sem luz própria.


Fraunhofer demonstrando o espectroscópio

Como trazer ouro das estrelas

O alemão Gustav Robert Kirchoff (1824 - 1887), um dos criadores do espectroscópio, destacou-se em vários segmentos da Física, sobretudo no campo da eletricidade e dos estudos energéticos relacionados com as radiações do corpo negro. Conta-se que se tornou muito popular e conhecido, pois era o cientista que procurava metais nas estrelas. Certa vez um vizinho debochado perguntou-lhe sobre a utilidade das suas pesquisas:

- De que vale procurar ouro no Sol, se você não vai conseguir trazê-lo para a Terra?

Muitas vezes laureado pelas academias científicas, Kirchoff recebeu certa vez uma medalha de ouro como prêmio por uma das suas pesquisas.

Consta que Kirchoff procurou o vizinho petulante para mostrar-lhe a recompensa:

- Eis aqui o ouro das estrelas!


Galáxia-borboleta
(Telescópio Hubble, 2009)

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

TÉDIO

UM LUGAR AO SOL


Dizia Heráclito de Éfeso que tudo está em permanente fluição, tanto que a você não é dado entrar pela segunda vez no mesmo rio. É que este já não será o mesmo, nem você.

- Foi o que sucedeu conosco.


Pois é, oito anos são suficientes para qualquer pessoa mudar, do primeiro ao último átomo, inexorável e definitivamente. Com o passar do tempo, Cecília e eu nos tornamos outros, não outros quaisquer e ocasionais, mas outros consumados, consumadíssimos. Nossas conquistas profissionais e materiais aos poucos passaram a não representar mais que uma higiene, a não nos garantir nenhum prazer nem estabilidade: uma higiene que de certo modo até nos desunia. Além disso, os prazeres da cama vão diminuindo lenta e progressivamente, e tenho para mim que não há comunhão de almas e união estável que não sejam garantidas a golpes de paixão e de volúpia. No início, lá atrás, eu queria um filho, mas Cecília me dissuadiu, pois filhos não se compatibilizavam com a dinâmica dos negócios, que sempre se opõem à normalidade da vida familiar. Bastava ver que éramos obrigados a constantes viagens ou a compromissos intermináveis e exaustivos.

De repente, passados os anos, decidiu mudar de ideia, e foi a minha vez de vetar a iniciativa. Ela, uma mulher especialmente inteligente, não se deu conta da irresponsabilidade que seria gerar um filho num casamento que definhava, anódino e desaquecido.

- Devemos continuar pensando com calma sobre esse assunto, Cecília. Vivemos num ritmo muito profissional, que teria de se alterar de forma importante antes de introduzir mais alguém no nosso espaço.

Tédio, quem sabe o tédio não seja exatamente isso?
Não sei, com efeito, das razões objetivas da nossa separação, se é que existiram. Creio que isso é tarefa para psicólogos e psicanalistas, essa gente que entende de alma e sabe como sondar o que temos de profundo e impenetrável. Nos meus insights amadores, concluí prosaicamente que no casamento cada um entra com sua quota de renúncia; são coisas banais, que incomodam, mas seguem toleradas porque o benefício da união é maior que os custos envolvidos. Ceder espaços, conviver com os pequenos defeitos recíprocos, não ter direito à solidão, discutir o que se quer fazer, e também o que não se quer fazer, são miudezas e futilidades que se acumulam ao longo do tempo e paulatinamente vão alterando a equação do casamento. Cecília se aborrecia quando voltávamos antecipadamente de Cabo Frio, na noite de sábado, quando eu tinha um desafio de tênis no domingo de manhã; reclamava das minhas reuniões de trabalho, quase todas as terças, a varar pela madrugada; e do chope, que eu tomava com os amigos nas noites da última quinta-feira de cada mês.

Mas eu também não cedia? Perdi o filme do Ettore Scola para ver Antonio Banderas e, ora pois, a partida final do campeonato para esperar tia Amália no aeroporto, e muitas vezes aturei intermináveis conversas sobre modas e percorri exposições que não me despertavam nenhum interesse. Ah, tive até de suportar um estilista americano, que ficou espantado quando percebeu que o Rio de Janeiro está mais para Nova York do que para Floresta Amazônica.

- Floresta Amazônica?

- Sempre pensei que o Brasil fosse uma ilha no rio Amazonas, infestada de índios e jacarés, mas cheia de cafezais, escolas de samba e mulheres de biquíni.

- Sim...

- Ao sul de Buenos Aires e ao norte de Copacabana.

A isso, tudo acumulado, costumo chamar de fadiga de material, pois não vejo outras razões no contexto da nossa separação. Isso mesmo, na nossa contabilidade conjugal não relaciono nenhum cristal quebrado, nem mágoas ou ressentimentos fundamentais. Rousseau, se me acudisse com alguma de suas autorizadas explicações, talvez atribuísse essa separação improvável à independência financeira dos parceiros, pois só a necessidade consolida e mantém a família; a não-necessidade opõe-se à sua estabilidade, ao tornar o desenlace fácil e operacional. Não descarto, porém, a hipótese de que esteja a malversar o desconcertante Rousseau, cuja obra li, anos atrás, de forma apressada e descomprometida.


Progressão é progressão, e um dia o custo ultrapassa o benefício. Até que ela me veio com aquela história de Montgomery Clift e Shelley Winters, um amor que teve de fenecer para ensejar outro amor, maior e renovado; eu merecia, assim também, encontrar minha Elizabeth Taylor, pois a mim não me faltavam os atributos para um merecido lugar ao sol. Foi assim, civilizadamente assim, que me comunicou que nosso casamento já não lhe interessava. Eu me esquivei de produzir uma ironia, a de lembrar que nessa história do lugar ao sol o personagem de Montgomery Clift terminou sendo arrastado para a cadeira elétrica. Achei, isto sim, que estava sendo protegido pela sorte, pois separar-me era tudo o que então desejava e, pelo que conheço de mim, se minha tivesse sido a iniciativa, mais um remorso teria para administrar.

- Pode ficar com a minha parte.

- Claro que não, Carlinhos.

Ela ficou com a casa no Itanhangá, o único bem material que tínhamos em comum, e me compensou com dinheiro bastante para um apartamento no Leblon. Uma derradeira convivência ainda nos tocou, sem nenhuma animosidade ou irritação. Que nem fariam sentido na nossa história, da qual a separação foi apenas um capítulo necessário. Estranho, porém, foi continuar transitando mais quarenta dias pelos caminhos da casa, pois nenhum cenário permanece neutro, nem impune, em face de um amor exaurido. Até a arte perde o sentido, as cores se esmaecem e, para dizer a verdade, nunca vi a menor graça naquela cortina da sala de visitas, lilás, isso mesmo, lilás, e em momento algum estive de acordo com a moldura que escolheu para o Böcklin que arrematamos no leilão da Bartolomeu Mitre.

Nem mesmo um telefonema ou um protocolar cartão de despedida. Pois um deixou de existir para o outro, aquele estágio na relação de duas pessoas que, para Octavio Paz, poderia chamar-se de nenhumação. No nosso caso, seria mais apropriado falar em nenhumação recíproca, que é a arte de inexistir daqui para lá e de lá para cá...

sábado, 9 de outubro de 2010

BURACOS NEGROS

VELOCIDADE DE ESCAPE

O corpo não cai se sua velocidade for
maior que avelocidade de escape (ramo superior)


Se um corpo for lançado para o alto, com velocidade de lançamento não superior a 11,2 quilômetros por segundo, o progresso do seu movimento é obstruído pelo campo gravitacional da Terra e o corpo cai sobre a superfície da mesma. Se superior a 11,2 km/s, o corpo escapa à ação gravitacional da Terra e a esta não volta mais. Todos os objetos na Terra sujeitam-se à mesma velocidade de escape de 11,2 km/s, independentemente de sua massa, seja esta de um quilograma ou de mil toneladas.
A velocidade de escape varia com o planeta, ou melhor, com o corpo celeste considerado. A da Terra é de 11,2 km/s. Ela depende da massa e do campo gravitacional do corpo celeste e da distância do objeto a ser lançado ao seu centro de gravidade.

- A velocidade de escape da da Lua é de de 2,4 km/s, a de Júpiter, de 61 km/s, e a do Sol, de 620 km/s.


Nem a luz


Chama-se de "buraco negro" ao corpo celeste cuja velocidade de escape é igual à velocidade da luz; como nada pode superar a velocidade da luz, segue-se que nada escapa do buraco negro, nem mesmo a própria luz. Torna-se impossível ver um astro desse tipo, pois sua luz não nos alcança, o que explica o nome que lhe foi atribuído.

- Os buracos negros são consumidores de informações.

Os buracos negros podem ter vários tamanhos. Alguns, nos centros das galáxias, teriam se formado pelo colapso do núcleo galático e podem pesar bilhões de massas solares. São buracos negros supermaciços. Há também buracos negros estelares, que resultam da última etapa da evolução das estrelas, sempre que sua massa for suficientemente elevada (superior a duas massas solares), na sua evolução para gigantes vermelhas e supernovas. As estrelas de nêutrons resultam das supernovas e, ao fim e ao cabo, transformam-se em buracos negros.

Estrelas de nêutrons

Os buracos negros foram previstos pelo astrônomo inglês John Michell (1724-1793), em 1793, numa suposição baseada na lei da gravitação de Newton. Em 1795, Pierre-Simon de Laplace (1749-1827), em seu livro de divulgação "Exposição do Sistema do Mundo", manifestou a convicção de que a gravidade atua sobre a luz, da mesma forma que atua sobre os outros corpos. Eis o que escreveu Laplace:

" Uma estrela brilhante que tenha densidade igual à da Terra e um diâmetro equivalente a 250 vezes o diâmetro do Sol, por causa de sua gravidade, não permite que os raios de sua luz viajem para nos alcançar; é muito possível que os corpos celestes mais brilhantes do Universo nos sejam totalmente invisíveis."

Laplace

Laplace acertou na mosca, ele que era muito bom matemático. Pois a estrela brilhante do seu exemplo teria uma velocidade de escape igual a 27 mil vezes a velocidade de escape da Terra, isto é, v. e. = 27.000 x 11,2 = 302, 4 mil k/s (maior que a velocidade da luz).

Karl Schwarzschild

Foi, entretanto, o alemão Karl Schwarzschild (1873-1916) quem construiu a solução matemática do buraco negro, com base na relatividade de Einstein. Pelas suas equações, apresentadas em 1915, nada impede que o buraco negro continue a contrair-se até sua implosão em um ponto no centro do buraco negro. A esse ponto de infinita pressão, densidade e curvatura do espaço-tempo, chama-se de "singularidade".

Perplexidade


- Honorificabilitudinitatibus...

A mistura impossível de Relatividade e Física Quântica
Recua no tempo e converge para o Big Bang,

O qual tudo acomoda, constrangendo todas as teorias.

Trata-se, como dizem, de uma singularidade,
De muita gravidade e pouca conversa,

Onde o espaço, envergonhado, põe-se a ferver,
E as hipotenusas ficam abraçadinhas com seus catetos.
Avassalado pelo espetáculo soberano da Natureza,
Não vislumbro a Nebulosa de Andrômeda,
Odeio a precessão dos equinócios
E tudo que sei é a Segunda Lei de Newton.
Desentendo com muita competência o grande, o pequeno e o veloz,
Mas tenho pena e medo dos buracos negros,
Que tudo sabem, mas não dizem coisa alguma.
Já me alertaram, porém, que nada se perde,
Nada se cria, tudo se transforma.
Dizer o quê? Honorificabilitudinitatibus...
Confesso, afinal e muito tristemente,
Que sou culpado, muito culpado, de não ter nascido Deus.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

INTELIGÊNCIA, TEU NOME É MULHER

VENEZA, GRANADAS E CAVALOS

Passamos todo o dia vendo Ticiano, Tintoretto e Veronese. À noite decidimos sair daquele espaço entre a Praça de São Marcos e Rialto, o roteiro da segurança, e nos pusemos a caminhar aleatória e irresponsavelmente por aqueles estranhos becos e vielas, deixando para trás todas as referências e sotopórtegos.


A inevitável consequência foi nos perdermos nos contornos recônditos da cidade, a qual, por sinal, sempre me pareceu um categórico labirinto. Na madrugada fria e silenciosa da Veneza aterradora, não havia uma única pessoa circulando pelas ruas, que nos socorresse com alguma orientação; rodávamos à busca de um rumo, cada vez mais perdidos e desnorteados; lembrei-me então dos casais assassinados naquelas reentrâncias, o que eu vira repetidas vezes em filmes e documentários. Cecília ria, sem nenhum receio ou constrangimento, achando divertido e até romântico estarmos assim perdidos, sem entender por que me mantinha tão preocupado. Quando, sãos e salvos, desembocamos junto do nosso hotel, que ficava ao lado do Palácio dos Doges, apontou para a Ponte dos Suspiros e exclamou, cheia de alegria:

- Carlinhos, você é o meu Casanova!

Ri, muito aliviado, mas decidi contar-lhe o perigo que havíamos passado, ao alcance de maníacos que trucidavam casais que se perdiam na madrugada escura de Veneza.

- Veneza, como Veneza? Ora, Carlinhos, isso é lá em Florença!

Eu me enganara. Não era a primeira vez, nem seria a última. Veneza passou a ser uma espécie de senha, e, toda vez que eu ia errar, ela me advertia com autoridade:

- Lembre-se de Veneza.


Ouro Preto

Certa vez tive de dar uma palestra em Ouro Preto, e ela decidiu me acompanhar. Terminado o compromisso, ficamos na cidade para conhecer igrejas, ver obras do Aleijadinho, visitar o Museu de Mineralogia e percorrer os sítios históricos, como as casas de Tiradentes, Marília de Dirceu, Cláudio Manoel da Costa e Tomaz Antônio Gonzaga. Corremos algumas lojas, e Cecília se encantou com um colar de granada, que custava dez mil e novecentos reais.



Quando eu preenchia o cheque, interrompeu a compra, movida por uma das suas intuições. Fomos a outras lojas e encontramos um colar, em tudo semelhante àquele, por escassos trezentos e vinte reais. Sua iniciativa implicou uma economia superior a dez mil reais, mais do que logo depois nos custou um mês de férias na Califórnia. "Granada" tornou-se outra senha importante para os avisos recíprocos diante de qualquer preço irrazoável.

- Granada.

- Sim, granada.

No hipódromo

E o episódio das corridas de cavalo? Expliquei-lhe como era o jogo, cada cavalo correndo na sua turma, e tudo que eu sabia sobre pista, distância, cânter, o partidor australiano, rateio, duplas e placês. Ah, expliquei também sobre o totalizador das apostas.

Eu estudava o programa e jogava, e ela, sem jogar, só observava. No último minuto das apostas do oitavo páreo, repentinamente decidiu jogar mil reais em Full Advantage, um cavalo que não tinha nenhuma chance, segundo todos os retrospectos e prognósticos. Que muitas vezes falham, falham sim, e esse foi o caso, pois Full Advantage ganhou a corrida facilmente. Cecília recebeu no guichê seis mil e oitocentos reais.

- Como você descobriu esse Full Advantage?

- Você se preocupou com o retrospecto dos cavalos, e eu, que não entendo nada disso, com o dinheiro.

- Com o dinheiro?

- Sim, com o dinheiro. Fiquei de olho no totalizador, ao longo de todos os páreos anteriores.

- Sim, a evolução das apostas...

- Tive a clara percepção de que há pessoas que sabem qual será o cavalo ganhador.

- Como assim?

- Ganha o cavalo cujas apostas crescem desproporcionalmente nos três minutos que antecedem à largada; quando vi crescer o volume jogado no Full Advantage, decidi assumir o meu risco.

- Coincidência, Cecília.

- Pode ser, mas funcionou.

Nesse dia perdi 700 reais, mas o saldo familiar foi positivo.

sábado, 2 de outubro de 2010

CONTEÚDO DO UNIVERSO

Matéria escura e energia escura

Cosmólogos e físicos de todo o mundo certamente continuarão buscando informações necessárias à consolidação da Teoria do Big Bang, em direção à verdade. Falando agora do conteúdo do Universo, antes que de sua origem, a matéria luminosa - ou seja, a que "vemos" porque emite radiação eletromagnética, a saber, luz, ondas de rádio, raios X e raios gama - é uma fração insignificante do total, este sobretudo constituído de “matéria escura” e de “energia escura”, das quais ainda se conhece muito pouco.

Matéria escura

Matéria escura

Foi descoberta a partir de 1930, quando o astrônomo suíço Fritz Zwick notou que as galáxias do aglomerado de Coma moviam-se muito rapidamente, o que era incompatível com as leis de Newton.

- Algo estranho... A velocidade excessiva do movimento deveria desmanchar o aglomerado, declarou Zwick.

Em 1962 a astrônoma Vera Rubin observou que a Via Láctea girava tão rapidamente que, se não houvesse uma força agrupadora, deveria desintegrar-se imediatamente. Era a mesma conclusão de Zwick, mas agora em relação à nossa própria galáxia.

- Como a desintegração não ocorre, pelas leis de Newton nossa galáxia teria de ser dez vezes mais pesada do que se supõe.

A própria Vera Rubin, prosseguindo nas suas observações, percebeu o mesmo comportamento em outras onze galáxias, segundo trabalho publicado em 1978; nesse mesmo ano, o radioastrônomo holandês Albert Bosma reportou um comportamento análogo em dezenas de outras galáxias.

-Um verdadeiro paradoxo, que ficou conhecido como "the galaxy rotation problem"
, pois as galáxias estariam a girar de maneira conflitante com as leis da Física.

Vera Cooper Rubin

Girando muito depressa, como pode?

Para explicar essa anomalia, chegou a ser proposta uma "dinâmica newtoniana modificada" (MOND), que não prosperou. A explicação hoje aceita pelos cientistas é a de que há uma matéria invisível no entorno das galáxias, a "matéria escura", dez vezes mais pesada do que as próprias estrelas, e cuja intensa gravidade explica o comportamento acelerado de cada galáxia.

-Invisível porque não interage com a luz.

Uma hipótese é, de fato, que a matéria escura seja formada por estrelas marrons, estrelas de nêutrons, buracos negros e outras estruturas invisíveis, constituídas de nêutrons e prótons (“matéria bariônica”), mas há os que afirmam tratar-se de neutrinos (matéria não-bariônica) muito quentes.
A matéria escura pode ser medida pela maneira por que curva a luz das estrelas, como consequência da sua gravidade. Muito recentemente, foram elaborados mapas de distribuição da matéria escura no Universo, tomando por base as fotografias colhidas pelo telescópio espacial Hubble, em 1998. Segundo esses estudos, a matéria escura compõe 23 % do conteúdo total de matéria e energia do Universo.

Energia escura
Telescópio Hubble

A observação distante, que permite ver os corpos celestes como eram bilhões de anos atrás, conduziu à descoberta da energia escura. Além de matéria escura, há também energia escura! De fato, o telescópio espacial Hubble, em 1998, observou as supernovas (explosões de estrelas em sua fase terminal) que existiram no Universo primordial, o que levou à descoberta de que o Universo no passado remoto se expandia menos do que atualmente.

- Ou seja, o Universo está se acelerando! Todos pensavam que estava se desacelerando!

A concepção de que o Universo estaria se desacelerando era atribuída à ação da gravidade, atuando em caráter exclusivo, com os corpos celestes a se atrairem e freiando a expansão.
Neste ponto é oportuno mencionar novamente a constante cosmológica de Einstein.
Como se recorda, conforme proposta, a constante cosmológica seria uma pressão inerente ao espaço, uma energia do vácuo, desprezável em distâncias curtas, mas significativa nas imensas distâncias do Universo, capaz de neutralizar a gravidade e de ser por esta neutralizada; por isso o Universo haveria de ser estático, no entender de Einstein.

- Para Einstein, força de expansão = força de atração.

A volta da constante cosmológica

Nos anos 1930, quando se provou que o Universo não era estático, mas que se expandia, é que se supôs que a expansão do Universo estava se desacelerando, com base nas concepções de Friedmann. Foi quando Einstein declarou:

- A constante cosmológica foi o maior erro da minha vida...

Pois bem, a aceleração do Universo, como observado em 1998, trouxe de volta a constante cosmológica. Não como Einstein imaginou, mas com muito mais poder e importância: passou-se a admitir uma energia de vácuo que permite acelerar o Universo.


- Força de expansão maior que força de atração, por causa de uma constante cosmológica maior do que a sugerida por Einstein.

- Ou seja, uma volta triunfal da constante cosmológica, depois de décadas de ostracismo.

A energia da constante cosmológica, que é a energia do espaço vazio, corresponde exatamente ao que se chama de "energia escura", cuja quantidade total é proporcional ao volume do Universo.
Os cálculos dos cientistas indicam que a energia escura compõe 73 % de toda a matéria e energia do Universo.

Em resumo

A matéria escura explica a velocidade de rotação das galáxias.
A matéria responde por 27 por cento do Universo, sendo 23 por cento de matéria escura e apenas 4 por cento de matéria convencional (matéria visível e matéria iluminada).

A energia escura explica a aceleração do Universo. Responde por 73 por cento do Universo.