sábado, 11 de junho de 2011

PRECONCEITO CONTRA A MULHER

EU, PARCEIRO DE MELISANDE

Certa vez Melisande deu uma palestra,“Psicologia do Preconceito”, dirigida a profissionais médicos e sociólogos, para a qual fui solicitado a dar uma modesta contribuição. A certa altura da exposição, convidou-me à frente do auditório para falar sobre Sophie Germain, uma das cientistas que eu pesquisara para minhas aulas.

Trata-se de uma francesa, nascida em 1776, que tinha extraordinária aptidão para a matemática, mas teve de se passar por homem, com o nome de Antoine-August Le Blanc, para estudar na Escola Politécnica de Paris, que, no alvorecer do século XIX, ainda era uma academia de ciências reservada para homens. Numa época em que as mulheres eram proibidas de estudar temas científicos, Sophie lia escondidamente sobre a Física, de Newton, e a Matemática, de Euler, à noite, depois que seus pais se recolhiam para dormir.

Antoine-August Le Blanc

Seu talento era, entretanto, tão grande que os maiores matemáticos europeus, como o francês Joseph-Louis Lagrange e o alemão Carl Friedrich Gauss, correspondiam-se com esse ""Le Blanc", sem saber que “ele” era ela.
A verdadeira identidade de Monsieur Le Blanc foi descoberta quando Napoleão invadiu a Prússia, em 1806. Pois Sophie Germain enviou uma carta ao general francês que comandou a invasão, pedindo-lhe que Gauss não fosse molestado.


Gauss

- Por que me poupam?, perguntou o matemático.


- A pedido de uma moça francesa, respondeu o general.

Na sequência desses eventos, descobriu-se a verdadeira identidade de Antoine-August Le Blanc. A correspondência de Sophie com o matemático Adrien-Marie Legendre trouxe uma contribuição importante para a Teoria dos Números.

Legendre

Ela também se destacou nos estudos da Matemática Pura, da Matemática Aplicada e sobretudo no campo da elasticidade dos materiais, tendo sido a única pessoa a submeter um trabalho no concurso organizado pelo Instituto Francês de Ciências, em 1808, para responder ao seguinte desafio: “Formular uma teoria matemática para as superfícies elásticas, demonstrando sua compatibilidade com os dados experimentais.”


Um quiilograma de ouro era o prêmio do vencedor, mas Sophie recusou-se a comparecer à cerimônia de premiação. Antes de morrer, escreveu um ensaio sobre a filosofia da ciência, que foi elogiado pelo filósofo Augusto Comte. Gauss queria que a francesa recebesse um grau de doutora honoris causa da Universidade de Göttingen, na Alemanha, mas a morte de Sophie Germain, em 1831, impediu que a honra lhe fosse conferida.


Quando encerrei o relato sobre a francesa, Melisande reassumiu a palestra e acrescentou que na estrutura da Torre Eiffel foram gravados os nomes de 72 sábios que de algum modo contribuíram para sua construção. Sophie Germain foi ignorada, não obstante seus estudos sobre resistência dos materiais, sem os quais a obra monumental não poderia ter sido erigida.
Seu atestado de óbito registrou que se tratava de “mulher solteira, sem profissão”, em vez de “matemática” ou “cientista”.
A mulher teve de superar preconceitos deste tipo, até sair da posição de inferioridade a que foi relegada desde a Antiguidade. Melisande adicinou nesse ponto quatro citações de acachapante preconceito:

(a) Para Platão, “os homens covardes, injustos durante sua vida, serão provavelmente transformados em mulheres quando reencarnarem”.

(b)Diderot escreveu que "a mulher é propriedade do homem."

(c) Schopenhauer colocou-a entre o homem e o animal, dizendo que “cabelos longos implicam inteligência curta”.

(d) Para Proudhon, uma mulher que trabalhava era uma ladra que roubava o trabalho de um homem.

Mas a mulher dos nossos dias decidiu ignorar esses juízos preconceituosos e está progressivamente alterando seu papel nas relações com os homens, igualando-se a eles ou, mesmo, sobrepujando-os.

- O que exige esforço, dedicação e rebeldia, pois, como afirmou Maria Shriver, “mulheres bem-comportadas não fazem história”.

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