quarta-feira, 1 de agosto de 2007

RETALHOS DO QUOTIDIANO (parte 25/26)

Seguindo o meu destino

Senti que minhas aulas agradavam, pois, assistidas inicialmente somente pelos alunos, passaram a ser freqüentadas por outros professores da Economia e até por professores de outros departamentos. Isso me estimulava a trabalhar cada vez mais, aumentando minha capacitação para fazer cálculos econômicos, decidir em regime de incerteza e negociar contratos de risco.
Eu escrevia apostilas para uso dos alunos, que se somavam aos livros que escolhia cuidadosamente e indicava como textos básicos. Minha intenção era desde então transformar essas apostilas, que fui aprimorando gradativamente, em livros a serem publicados comercialmente.

Minhas conquistas

Sigo o destino que me é imposto, mas, convenhamos, sempre faço força para aproveitar as oportunidades que as circunstâncias me oferecem. Terminado o semestre, com efeito, fui efetivado com salário de professor titular. Viva eu cá na Terra sempre a merecer minhas conquistas! Pequenas, é verdade, mas, ainda assim, conquistas.
Desliguei-me definitivamente da Física, mas tive o cuidado de procurar Ignácio de Sitter, Rafael Lemaitre e Maria Hoyle para depor-lhe o meu agradecimento pela acolhida generosa que me deram nas três semanas do nosso convívio.
Não posso deixar de reconhecer que a Física, mesmo indiretamente, muito contribuiu para que eu ascendesse à minha nova posição e igual importância dou ao congresso de Buenos Aires.
Seja como for,
eu me tornara um professor de verdade e não era mais um Al Pacino desempregado, a sonhar com Albert Einstein e seus cartões de visitas.

Laura e eu

Continuávamos ligados pelos momentos de ternura, mas nos emails freqüentes só tratávamos das nossas respectivas caminhadas profissionais. Era certo que ela fazia uma carreira vitoriosa no King’s College, a serviço da resistência dos materiais e da Mecânica Vibratória, restando bem implícito que nossas trajetórias eram divergentes e até irreconciliáveis.
Os êxitos recíprocos nos separavam. Não me surpreenderia se algum dia ela viesse com a notícia de que iria se casar com algum cavalheiro inglês numa igreja de Londres. Tudo que me cabia era esperar que não fosse nenhum membro ocioso da Família Real!
Não tive vontade de me aproximar de outras mulheres, pois, no fundo, isso me parecia um ato de deslealdade, uma aleivosia, sei lá.

May e Kurtis

Certo dia, conversando sobre amenidades, Estênio Florão pôs-se a elogiar o Kurtis, para ele uma pessoa de qualidades excepcionais. Àquela altura até eu tinha simpatia pelo cujo,
que me legara suas cadeiras na Economia. Melhor que isso, ele me indicara como seu substituto!

- Saindo da Universidade, mudou-se para a Inglaterra, levando consigo uma sobrinha egiptóloga.


- Sobrinha egiptóloga? Era casado com ela?

- Não, não. Ele casou-se recentemente com uma empresária, mas não cheguei a conhecê-la. A sobrinha, que também não conheci, aproveitou a mudança do tio para fazer um PhD na Universidade de Londres. É tudo que sei.


Ora essa! May era sobrinha do Kurtis, não sua amante, e estava estudando em Londres!
Que coincidência! Fazia mais sentido... Fosse o que fosse, isso não tinha a menor importância, pois May deixara de ser importante para mim.
Como pode? Minhas duas últimas namoradas estavam ambas na Universidade de Londres!
(continua)

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