quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O NOVO DEQUINHA (parte 2/5)

Dedeu

Nicanor e Dedeu saíram cedo da Serra do Mendanha, caminhando até a estação de Bangu, p
ara pegar o primeiro trem da manhã. Na Gávea, o treino dos juvenis começaria às nove. Enquanto o trem corria, e o subúrbio ia pulando para trás, Nicanor rememorava os grandes nomes do Flamengo: Fausto, Leônidas, Domingos, Zizinho, Bria, Biguá, Jaime de Almeida, Doutor Rúbis, Lico, Dida, Mozer, Aldair, Júnior, Evaristo, Dequinha, Pirilo, Almir, Joel, Carpegiani, Vevé, Raul, Índio, Sinforiano Garcia, Rondinelli, Benitez, Adílio,Tita, Andrade, Leandro. Zico, Zico, Zico. O Mário Venâncio, Deus é que sabe do Mário...

Jaime de Almeida

- Chegou a vez do Dedeu.


Dedeu trazia debaixo do braço a chuteira novinha em folha, uma extravagância que, embora necessária, enforcou a família no crediário insuportável. Olhava assustado para o pai, pois tinha medo de desapontá-lo. A bem da verdade, daria tudo para não estar naquela situação, obrigado a uma glória a ser conquistada a pontapés.

- Eu fui um zagueiro tão bom como Domingos da Guia, disse Nicanor, quando o trem parou na Central.


Já no ônibus, consultou mais uma vez o bolso do macacão, assegurando-se de que não havia esquecido o bilhete do doutor Oest. Quando saltaram perto do Miguel Couto, Nicanor deu um forte abraço em Dedeu e apontou-lhe a porta do Flamengo. Deixou-o seguir sozinho e permaneceu estacado, observando o passo cambaleante do filho em direção à imortalidade.
Dedeu exibiu o bilhete, e o porteiro girou a borboleta, deixando-o passar Gávea adentro.
De longe, Nicanor acompanhou aquela coreografia de sonho: o dia mais importante da sua vida.

A Lagoa, bem pertinho, e no alto o Cristo Redentor. Aquela gente alegre e barulhenta que buscava as piscinas ou se dirigia às quadras, os vestiários, os bares, os cuidados médicos, o gramado tão bem cuidado por um exército de profissionais, tudo o fascinava. Jamais sonhara estar num ambiente assim, ele, do subúrbio remoto, respirando aquele ar de Zona Sul.

- Jogando no Flamengo!

Aceito com cordialidade,
integrou-se facilmente ao grupo, onde prevaleciam a camaradagem e o respeito, pois todos tinham o mesmo ideal, que era fazer do futebol a sua profissão. Dedeu foi logo fazendo amizade com o Carijó, que era bem-humorado e extrovertido.

- Quero ser jogador de futebol para não ser prefeito, dizia-lhe o novo amigo.

- Essa eu não entendi.

- Meu pai deseja que eu seja prefeito. Ou, então, jogador de futebol. Escolhi ser jogador, pois acho muito ruim sair por aí pedindo voto e me gabando de competência. E tem mais...

- Mais o quê?

- O que não falta é mulher bonita na área...

Dedeu não teve nenhuma dificuldade para adaptar-se às rotinas de treinamento, diárias e exaustivas. Paulo César, que precisava de um lateral, imediatamente submeteu-o a exercícios físicos especiais. Depois, os treinos técnicos exaustivos, para chutar com qualquer das pernas ou para centrar de modo que a bola descaísse em folha-seca, numa trajetória feita de intersecções de parábolas que se sucediam e se interpenetravam, o mesmo efeito mágico que Didi usou, em 1957, para derrotar os peruanos no Maracanã. Quando o time perdesse a bola, teria de voltar, em alta velocidade e pelo meio, para ocupar a posição do zagueiro que lhe dava cobertura na lateral.

- Quem não pode cumprir esse fundamento, faz melhor se desistir de jogar futebol, preconizava o treinador.
(continua)

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