quarta-feira, 10 de junho de 2009

DENTRO E FORA, COMO PODE?

Paradoxo de Creta

Lado leste de Creta

No século VI a. C., o cretense Epimênides fez uma declaração, conhecida como "paradoxo de Creta" ou "paradoxo do mentiroso":

- Todos os cretenses são mentirosos.

Essa afirmação consta da Bíblia, Novo Testamento, Epístola a Tito, 1:12. A declaração é verdadeira ou falsa? Sendo Epimênides, ele próprio, um cretense, não se pode responder nem sim nem não, pois, sendo verdade o que disse, a afirmação é falsa. Se o que disse for mentira, a afirmação é igualmente falsa.

- Os que lerem a Epístola não têm como saber, pois estarão diante de uma questão paradoxal e indecídivel.


Epimênides

- Os cretenses são mentirosos.

Eubúlides de Mileto viveu no século IV a. C. e era rival e desafeto de Aristóteles, cujos silogismos ridicularizou publicamente. É de Eubúlides uma formulação com resultado tão paradoxal como o da afirmação de Epimênides:

- Um homem diz que está a mentir. O que ele diz é verdade?


Se for verdade o que diz, a mensagem é falsa. Se for mentira, a mensagem também é falsa.

- Impossível responder
.

Groucho Marx

Muitos consideram uma variante do mesmo paradoxo a famosa declaração do comediante Groucho Marx, explicando sua exigência e dificuldade para associar-se a um clube:

- Jamais pertencerei a um clube que tenha o descuidado de aceitar-me como sócio.


A provocação de Churchill

Winston Churchill certa vez dirigiu a um desafeto a seguinte pergunta:

- Você ainda tem o hábito de roubar?

Churchill

O pobre adversário não pôde responder nem sim, nem não, pois por qualquer escolha estaria admitindo sua desonestidade.

Consequência das afirmações indecidíveis


Gödel

Em 1931 o matemático checo Kurt Gödel, tomando por base os paradoxos de indecidibilidade, que em conjunto são chamados de Paradoxo de Russell, demonstrou que muitas afirmações matemáticas verdadeiras não são passíveis de ser provadas; são as chamadas proposições indecidíveis ou não demonstráveis. A demonstração de Gödel derrubou a teoria, sustentada pelo eminente matemático alemão David Hilbert, de que toda verdade matemática pode ser provada a partir de axiomas básicos.

Christian Goldbach

Há, pois, verdades matemáticas que nunca serão provadas, e este pode ser o caso da Conjectura de Goldbach: "todo número par, a partir de quatro, pode ser reduzido à soma de dois primos". Exemplos:

20 = 7 + 13

80 = 19 + 61

120 = 11 + 109
Carta de Goldbach a Euler, propondo a conjectura

A conjectura foi proposta por Christian Goldbach a Euler em 1742. Nunca foi encontrada nenhuma exceção para a mesma, mas ninguém conseguiu prová-la. Resposta de Euler:

- Acho que você está certo... Os números pares são infinitos, e só uma prova transformará essa "conjectura" em " teorema". Mas não sei como fazer a demonstração.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

FUI AO TEXAS E VOLTEI CASADO

Uma primavera universitária

Universidade do Texas, em Austin

Era a nossa primeira aula na Universidade do Texas. O professor Burford, comentando o teste de suficiência, revelou que dois alunos haviam se confundido na interpretação da terceira questão. Pelo mesmo e prosaico motivo: dificuldades com o idioma inglês. Ambos brasileiros, ambos recém-chegados a Austin, esta cidade generosa que acolhe tantos estudantes estrangeiros.

- Um deles é este aqui, disse Burford, apoiando a mão sobre meu ombro, e ele se chama Carlos Auvergne de Carvalho. The quick brown fox jumps over the lazy dog e, não obstante, o senhor não soube o que eu quis dizer com "dummy variable". Veja só!

Um vexame que nem cheguei a padecer, pois o professor, deslocando-se para o outro lado da sala, apontou para a bela jovem de saia negra e casaco cinza. Foi naquele momento que a vi pela primeira vez.

- Cecília, Cecília Lafayette de Castro.

Cecília

O aplauso de toda a turma era uma demonstração de solidariedade, que ela agradecia cheia de modéstia, mas com sorriso cativante. Um tributo à sua extraordinária beleza, pois, se assim não fosse, teriam me aplaudido também, por que não?
Importante é que eu já não estava só naquele mundo estrangeiro, cujo sotaque eu decifrava com dificuldade e ouvido incompetente. No Union's, o restaurante do campus universitário, ela me explicou que era arquiteta por formação, mas tinha a ambição de ser estilista.


- The quick brown fox jumps over the lazy dog, o que é isso?

- A ligeira raposa marrom pula sobre o cão preguiçoso. É uma frase que contém todas as letras do alfabeto inglês, usadas nos testes relacionados com as máquinas de telégrafo. Essa frase faz parte do show do Burford, que viu em nós, estrangeiros, o pretexto para dizer que o inglês se espalha galhardamente por aí, em todas as bibliotecas do mundo, usando não mais que escassas 26 letras. Daí a estranheza com alunos graduados que não sabem o que é dummy variable. Já pensou na tragédia que será alguém morrer sem saber o significado de dummy variable?

- Ou seja, isso de não saber inglês é pura negligência... Devemos reconhecer, todavia, que ele foi atencioso conosco, pois, seja como for, fomos apresentados à turma.

- Sem dúvida... Mas, voltando à raposa, será que ele sabe português? São apenas 23 letras, se não estou enganada.

- Apenas 23, sim, mas suficientes para escrever os Lusíadas.

- E as crônicas do Rubem Braga...

- Mudando de assunto, Cecília, por que uma estilista tem de estudar estatística?

Curva normal, de Gauss

- Porque trabalha com moda.

- Um trocadilho?

- Onde você acha que os estatísticos foram buscar sua noção de moda? A moda, a das roupas, tem tudo a ver com amostragem, média, mediana, momentos, desvio padrão...

- É, basta ter uma distribuição de freqüências.

- E você, por que está aqui, na Universidade do Texas?

- Bem, sou engenheiro recém-formado e cumpro um treinamento de três meses, a serviço da WED.

- WED?

- Sim, W-E-D, Western Energy Development.

Cecília e eu decidimos estudar juntos e, entre histogramas, regressões e números-índices, tive a percepção de que estávamos construindo uma parceria vitoriosa, que iria para além de uma primavera universitária no Texas. Acertei, pois logo estávamos namorando, e morando juntos, perfeitamente integrados um ao outro. Terminado o curso, visitamos Nova Orleans, San Francisco e Nova York, antes de voltar para o Rio de Janeiro.

- Se você quiser, Cecília, podemos duas coisas.

- Acho que podemos mais do que duas coisas, Carlinhos.

- Sim, mas quero me referir a duas delas, muito específicas e fundamentais. A primeira é estabelecer um binômio para nós, lealdade e generosidade.

- Muito justo e pertinente. E a outra?

- É a gente se casar.

Ela topou, que esse era também o seu desejo.

- Mas, quando?

- Agora, que a burocracia virá depois.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

ACORDO ORTOGRÁFICO

Confusão

O Acordo Ortográfico parece que vai exigir mais trabalho do que imaginado inicialmente, pois
, para dirimir dúvidas quanto ao uso do hífen, teremos de ir frequentemente ao dicionário. Pelo andar da carruagem, nem os especialistas (ortógrafos? lexicógrafos?) parecem estar se entendendo sobre as novas regras, apontando várias lacunas, contradições e inconsistências no texto acordado. Exegetas experimentados nas questões do idioma haverão de decifrar se devemos escrever "jogo treino" ou "jogo-treino", "francoatirador", "franco atirador" ou "franco-atirador", "lava rápido", "lavarrápido" ou "lava-rápido". Em tempo, "mega-sena" ou "megassena", "bem mandado" ou "bem-mandado"?

- Água-de-coco ou água de coco?

- Em que as pessoas devem fundamentar-se nessa questão do hífen?

- Na Base XV do Acordo, que tem a seguinte redação:

"Emprega-se o hífen nas palavras compostas por justaposição que não contêm formas de ligação e cujos elementos de natureza nominal, adjetival, numeral ou verbal, constituem uma unidade sintagmática e semântica e mantêm acento próprio, podendo dar-se o caso de o primeiro elemento estar reduzido. Exemplos: conta-gotas, finca-pé, guarda-chuva.
Certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente: girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedismo, etc.
"

"Pontapé", mas "finca-pé"

- Não entendi, mas gostei muito do "etc", no final... Acho até que o texto faz confusão entre justaposição e aglutinação, sei lá. Mais que isso, tenho para mim que as expressões "certos compostos" e "em certa medida" devem ajudar muito o entendimento dos que estiverem entendendo o resto. Mas, vem cá,"finca-pé" e "mandachuva" seguem regras diferentes de hifenação? Outra coisa: pela regra não devia ser "justa-posição", em lugar de "justaposição"?

- Para transitar com segurança nessa questão, o usuário do idioma deverá verificar, em cada caso, se está diante de um encadeamento vocabular ou de uma palavra composta
. Feita a verificação, saberá grafar corretamente:

"paraquedas", mas "para-choque";

"guarda-chuva", mas "mandachuva";

"Porto Alegre", mas "porto-alegrense".


- É assim, é?

- Distinguir sempre se não se trata de unidade fraseológica constitutiva de lexia nominalizada.

- Caramba!

No restaurante

Bife malpassado, sem hífen

- Garçom, este bife está malpassado?

- Não senhor, está bem-passado, com hífen.


Na loja de perfumes

Águas-de-colônias, cheias de hífens

- Vocês têm água de cheiro?

- Não, pois não vendemos nada que não seja hifenado. Temos água-de-colônia.


Não e quase
Sistema não linear

- Usa-se o hífen depois de "não" e "quase", quando atuando como prefixos, como em "equações não lineares" e "quase arquiteto"?

- Não.


- Não, mesmo?

- Bem, quando houver necessidade de ênfase estilística, pode-se usar o hífen nestes e em todos os outros casos nos quais o uso permitir. Entendeu?

- Não, não entendi.
- Acho que sou quase-burro, com muita ênfase.

Uma tentativa nos Estados Unidos

Uma reformulação ortográfica implica, no ato mesmo da sua imposição, a maculação irreversível de todas as bibliotecas construídas de acordo com as regras anteriores da língua, com graves consequências econômicas, e só por isso haveria de ser um recurso extremo e de caráter definitivo. Essa a razão pela qual um acordo desse tipo vem sendo recusado, desde muitos séculos, pelos países de língua inglesa e de língua francesa, para citar duas das línguas mais importantes e, não obstante, mais cheias de problemas.
Nem o presidente Theodore Roosevelt, com sua autoridade de intelectual e líder carismático, conseguiu bancar uma reforma desse tipo nos Estados Unidos. Uma comissão chamada de Simplified Spelling Board (da qual fazia parte Mark Twain) organizou uma lista de 300 palavras inglesas que deveriam ser imediatamente escritas de maneira simplificada, recomendando que outras modificações fossem introduzidas no decorrer do tempo. Essa iniciativa desonerava a assoberbadíssima língua inglesa, e alguns aceitaram a lista imediatamente, até mesmo algumas escolas.

- "Enough" seria substituída por "enuf", "phantasy" por "fantasy", "night" por "nite", "although" por "altho", "catalogue" por "catalog", e assim por diante.

O maior entusiasta da simplificação foi Theodore Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, que enviou uma ordem ao United States Government Printing Office (Departamento de Imprensa do Governo), em 27 de agosto de 1906, determinando que os documentos oficiais passassem a adotar a lista das 300 palavras modificadas.


Rondon, amigo de Theodore Roosevelt

Houve, porém, forte reação popular, pois os que aceitavam a simplificação eram na verdade minoria. Os jornais passaram a fazer piadas sobre a reforma, que foi rejeitada pelo Congresso em 13 de dezembro de 1906 e a seguir pela Suprema Corte dos Estados Unidos.

sábado, 23 de maio de 2009

A IMAGEM DO UNIVERSO (26/n)

NEWTON UNIU A TERRA E O CÉU

- Estou vendo quatro luas em Júpiter...

O sistema heliocêntrico de Copérnico fez ruir a ideia da fixidez e centralidade da Terra; Tycho Brahe, ao descobrir uma supernova, manchou a reputação do céu imutável; e Johannes Kepler, pouco depois, mostrou que as órbitas dos astros, elípticas antes que circulares, são percorridas com velocidades maiores quando mais perto eles estão do Sol, e menores, quando dele se afastam. Complementando a derrocada das ideias de Aristóteles, o professor Galileu Galilei, da Universidade de Pádua, constatou com seu telescópio perspicaz a existência das irregularidades da Lua, das manchas solares, das fases de Vênus e das luas de Júpiter.
Veio então o inevitável: as concepções divinatórias começararam a ser substituídas pelas explicações científicas, num processo em que se destacaram o próprio Galileu, Descartes e, sobretudo, Isaac Newton.

Duas forças componentes

Por quê? Por quê?

Para justificar as órbitas elípticas dos planetas, Kepler imaginou que cada planeta deveria seguir a resultante de duas forças, uma das quais situada no próprio planeta, e a outra, proveniente do Sol. Kepler só errou por imaginar que as duas forças teriam natureza magnética. Pois, com Galileu, Descartes e Newton, foi possível saber que se tratava da inércia e da gravidade.

Inércia

Por causa da inércia, tudo que vemos sobre nosso planeta conserva o movimento da Terra em todas as circunstâncias, pensou Galileu. A pedra cai no mesmo lugar, e não no quintal do vizinho, porque, ficando parada, subindo ou descendo, a ela a cada instante sempre se adiciona o movimento da Terra.
A ideia de Galileu foi depois aperfeiçoada por René Descartes (1596-1650) , ao intuir que uma partícula, isolada e sem nenhuma interferência, deslocando-se num espaço infinito, permaneceria sempre em linha reta e com a mesma velocidade. Quaisquer desvios das tendências retilíneas dos movimentos naturais deviam ser consequência de ações exteriores, ou seja, as órbitas curvas e fechadas dos planetas eram indício de que uma força exterior adicionava-se à inércia.
Descartes alinhava-se com Kepler, mas, como este, desconhecia a natureza da força que se conjugava com a inércia para dotar os planetas de órbitas elípticas.

Gravidade

Isaac Newton

Por volta de 1680 três cientistas ingleses, Christopher Wren, Robert Hooke e Edmund Halley comentaram entre si sobre as órbitas elípticas dos planetas, conforme estabelecia a primeira lei de Kepler. Era o assunto do dia nas rodas científicas. Parece que foi Hooke o primeiro a pensar que, para os planetas permanecerem em órbita, deveria atuar sobre eles uma força, orientada para o Sol, cuja intensidade fosse tanto maior quanto menor fosse a distância entre o planeta e aquela estrela, na razão inversa dos quadrados. O grande desafio era demonstrar, a partir de cálculos rigorosos, que uma força desse tipo levava os planetas a descreverem órbitas elípticas, como afirmava a primeira lei de Kepler.

- Já comentei essa ideia com Isaac Newton, teria dito Robert Hooke.


Diante disso, Halley procurou Newton e perguntou-lhe sobre como seria a curva descrita pelos planetas, caso houvesse, somando-se à inércia, uma força de atração do Sol inversamente proporcional ao quadrado da distância. Newton teria respondido imediatamente:

- Uma elipse.

- Como você sabe disso?

- Eu fiz os cálculos. A força de atração do Sol sobre um planeta, que se exerce na razão direta das massas e na razão inversa do quadrado das distâncias, combinada com a inércia do planeta, explica as órbitas elípticas, respondeu Newton.

Como era de se esperar, o fato deu lugar a intensa disputa entre Newton e Hooke, pois ambos se atribuíam a primazia de haver descoberto a natureza da gravidade.
Seja como for, foi Newton,
no seu livro "Philosophiae Naturalis Principia Matematica" ("Princípios Naturais da Filosofia Matemática"), publicado em 1687, quem enunciou a Lei da Gravitação Universal, que alguns chamam de quarta lei de Newton:

"No Universo tudo se passa como se os corpos se atraíssem, na razão direta das massas e na razão inversa do quadrado da sua distância".


Isaac Newton (1642-1727) costuma ser apontado como o maior de todos os cientistas. Criou o cálculo infinitesimal, introduziu as leis da refração e reflexão da luz, criou o telescópio por reflexão, explicou as marés, contribuiu para o avanço da termodinâmica e da acústica e apresentou uma explicação plausível para a origem das estrelas. No "Philosophiae Naturalis Principia Matematica", para além da Lei da Gravitação Universal, enunciou as três leis da mecânica clássica:

Primeira lei de Newton (ou lei da inércia)

"Um corpo não pode, por si só, modificar o seu estado de repouso ou de movimento retilíneo uniforme."

A inércia força o copo a permanecer no mesmo lugar.

Por causa da inércia, se o cavalo estaca, o cavaleiro prossegue.


Segunda lei de Newton


"A aceleração de um móvel é proporcional à força que atua sobre ele."

Maior força, maior aceleração.

Terceira lei de Newton

"A toda ação corresponde uma reação igual e oposta."

O carro chocou-se com o muro, que reagiu à altura.

Deus e Newton


Eis os versos do poeta inglês Alexander Pope (1688-1744), gravados no túmulo de Isaac Newton, na Abadia de Westminster, em Londres, Inglaterra:



Nature and Nature's law lay hid in night.
God sad “Let Newton be“ and all was light.


Túmulo de Isaac Newton

A natureza e as leis naturais jaziam dentro da noite.
Disse Deus “Que seja Newton” e a luz se fez.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

ELISA E A ETIQUETA

Aprendendo maneiras

- Elisa vai lhe ensinar maneiras e, depois, sobre cepas e investimentos.


- Como assim?, perguntei, assustado.

- Ora, Thales, você participará de inúmeros encontros internacionais, de grave responsabilidade. Por isso, é essencial que saiba o que os outros não sabem. Imagine-se à mesa, no Castelo Sforza, em Milão, com Silvio Berlusconi, Diane Keaton e Sofia Loren, e, por hipótese,....

Sofia Loren
- Eu, exatamente eu?

... a você é dado escolher um vinho para acompanhar o prato sugerido por Sofia Loren:
pato selvagem da região de Trentino, com molho béchamel de Toscana. Como fazê-lo, sem conhecer sobre fenólicos e taninos ou ignorando a diferença entre um varietal italiano e um magnífico bordeaux, mis en bouteille à la propriété?

- Mis en bouteille à la propriété?

- Da mesma forma, você não poderá errar na hora dos talheres.

- Espero acertar.

Diane Keaton

- Depois, no decorrer da desgustação, não lhe cabe ignorar o teorema das forças vivas, a teoria das supercordas, as concepções de Demócrito de Abdera ou, enfim, por que Tony Blair sustentou várias vezes na Câmara dos Lordes que a Inglaterra sempre se sai bem nos processos de benchmarking.

- Benchmarking?


- Sim, uma p
esquisa que permite avaliar um desempenho, comparando-o com um referencial de excelência, chamado de benchmark.

Saber o que é benchmarking, onde já se viu? Hei de arranjar uma maneira de avisar a esse pessoal que nasci em Cascadura, pois com certeza estão cometendo um descomunal erro de pessoa. Morrer, dormir, renascer em Copacabana, quem sabe?


- Aprender tudo isso, eu, euzinho? Você está falando sério?

- Seriíssimo. O homem moderno distingue-se pelo estilo e, principalmente, pelo nível de suas informações.

- Tudo bem, tudo bem.

- Preste muita atenção, para não ser reprovado.

O negócio é seguir em frente. É melhor receber aulas de etiqueta, saber o que é benchmark, e até ser reprovado, do que pedir dinheiro emprestado, contrair malária ou penar na fila dos doentes irreversíveis.


Etiqueta

Ela se chama Elisa e vai me ensinar etiqueta, mais do que isso não sei.

- Os etimologistas afirmam que na época do Absolutismo os burgueses, de pouco refinamento, recebiam na forma de bilhetes (”etiquettes”) acostados aos respectivos convites as regras de comportamento a serem observadas nos eventos da Corte. Essa a origem da palavra “etiqueta”.

- Muito interessante...

- Muito interessante? Fica melhor pensar que etiqueta é uma extensão da ética, uma eticazinha, como norma comportamental de respeito ao outro, dissociando-a das concepções preconceituosas que a relacionam com gestos de submissão, cerimoniais, salamaleques, frases feitas, talheres de prata, uso de luvas, fraques ou cartolas. Ser gentil com caixas de supermercado, não usar telefone celular em ambientes fechados ou ceder a vez a uma senhora na fila é mais importante do ponto de vista social do que segurar corretamente o garfo ou saber como dirigir-se a um garçom. A pessoa precisa saber como recusar um convite, comportar-se perante idosos e portadores de deficiências físicas, corresponder a um favor recebido, organizar uma lista de convidados ou agradecer por um presente de casamento. Não comentar sobre defeitos de outros, não ufanar-se, permitir que as outras pessoas também se manifestem e tomar em consideração opiniões e posições alheias. Não exibir-se, nem mostrar o que não sabe...

- Sempre faço muita força para isso, professora.


- Aprenda a dizer “bom dia”, “por favor” e “muito obrigado”. Se não quer, diga “não”. Se não sabe, diga “não sei”. Se tiver dúvida, peça todos os esclarecimentos. Seja assertivo, impondo-se sempre, mas sem grosseria, que esta nunca rendeu nenhum dividendo em favor de ninguém.

Meus pensamentos enquanto ela falava

- Será que está flertando comigo?

Linda, linda, a Elisa.
Acho que está flertando comigo.
Não, não, não, claro que não.

Não posso dar nenhuma bandeira.
Se dou um fora, ela me reprova, perco tanto o emprego quanto os banquetes com a Sofia Loren, retornando a Cascadura...


Benchmark

Acordei no meio da noite e percebi que Elisa estava deitada a meu lado, seminua.
Linda e pura como uma Desdêmona de Verdi.
Lembro-me de que segurou minha mão carinhosamente.

Elisa
- Thales?

- Sim, Elisa.

- Você está aprovado, pois tem o melhor benchmark...

sábado, 16 de maio de 2009

A IMAGEM DO UNIVERSO (25/n)

GALILEU GALILEI, O ANTICRISTO (2/2)

A militância bem-sucedida de Galileu, baseada nas suas contundentes observações sobre o Sol, a Lua, Júpiter e Vênus, contribuía decisivamente para que o Sistema de Ptolomeu caminhasse para um fim de carreira naquele início do século XVII. Tanto foi assim que os jesuítas acabaram apelando para o sistema híbrido de Tycho Brahe: os planetas, exceto a Terra, girando em torno do Sol; mas o Sol e a Lua fazendo-o em torno da Terra.


Vênus

Ao contrário dos jesuítas, dispostos a uma abertura no sentido de aceitar alguns pontos defendidos por Galileu, as demais congregações religiosas aferravam-se ao aristotelismo escolástico de São Tomás de Aquino e outros doutrinadores católicos. Concediam, quando muito, que o sistema de Copérnico fosse apresentado como "mera hipótese matemática, servindo apenas para facilitar os cálculos astronômicos, sem corresponder à realidade, pois, nesta, a Terra é o verdadeiro centro de tudo".

Ao argumento de Galileu de que a "filosofia do Universo está escrita em linguagem matemática, e seus símbolos são triângulos, círculos e outras figuras geométricas", o dominicano Tommaso Caccini, um de seus principais opositores, costumava retrucar:

- A geometria é do diabo, e os matemáticos deveriam ser banidos por serem autores de todas as heresias.

- Saibam, senhores, que a soma dos ângulos
internos de um triângulo é igual a 180 graus


Em 1616, Galileu foi informado pelo cardeal Roberto Belarmino de que não poderia divulgar argumentos em favor do heliocentrismo, sob pena de ser encarcerado. Galileu aceitou o veto e o respeitou por 16 anos, mas em 1632 publicou um "Diálogo Sobre Os Dois Maiores Sistemas do Mundo", onde um personagem inteligente (Salviati) defende o heliocentrismo e um personagem pouco esclarecido, tendendo para o simplório (Simplicius), mantém-se apegado às ideias de Ptolomeu.

Cardeal Roberto Belarmino

A Igreja entendeu que Simplicius era a caricatura
do Papa Urbano VIII e chamou Galileu a Roma, submetendo-o a sucessivas reuniões interrogatórias perante o Santo Ofício. Ameaçado de tortura e de ser queimado na fogueira, como fora o caso de Giordano Bruno, Galileu acabou por fazer uma declaração, solene, negando que a Terra se movesse e que girasse em torno do Sol.

A abjuração de Galileu

Santo Ofício

O Tribunal da Inquisição a que Galileu foi submetido era constituído pelos cardeais F. de Ascoli, B. de Gessi, G. Bentivoglio, F. Verospi, F. D. de Cremona, M. Ginetti, e F. D. de S. Onofrio.
Em 22 de junho de 1633,
Galileu abjurou como herética a concepção de que a Terra girasse em torno do Sol, nos termos da seguinte declaração final:

"Eu, Galileu Galilei, filho do falecido Vicenzo Galilei, ajoelhado diante dos senhores, eminentes e venerandos cardeais, inquisidores contra a depravação herética em todo o mundo cristão, tendo diante dos meus olhos e tocando com minhas mãos os Evangelhos Sagrados, juro que acreditarei doravante em tudo que é defendido, pregado e ensinado pela Santa Igreja Católica e Apostólica Romana.
Embora advertido por este
Santo Ofício de que deveria abandonar a falsa assertiva de que o Sol é o centro do universo e de que permanece imóvel, e de que a Terra é que se move e não está no centro, pois essa doutrina é contrária à Sagrada Escritura, escrevi e publiquei um livro no qual acrescentei argumentos consistentes em favor da doutrina condenada, sem opor nenhuma solução para os mesmos.
Por essa razão fui pronunciado pelo Santo Ofício como forte suspeito de heresia, isto é, de ter acreditado e sustentado que o Sol é o centro do nosso universo e está imóvel, e de que a Terra não é o centro e se move
.
Desejando afastar do pensamento de Vossas Eminências, e de todos os fiéis cristãos, essas suspeitas razoáveis que existem contra mim, é que, com coração sincero e fé imaculada, abjuro, condeno e abomino os erros e heresias supracitados, e qualquer outro ato que esteja em desacordo com a Santa Igreja.

Juro que doravante nunca mais direi, oralmente ou por escrito, alguma coisa que reacenda essa suspeita contra mim; e que, se souber de alguém que seja suspeito de heresia ou que incorra em prática de heresia, denunciá-lo-ei ao Santo Ofício ou ao inquisidor da localidade onde me encontrar.

Juro e prometo ainda observar integralmente todas as penalidades que me foram ou me vierem a ser impostas pelo Santo Ofício.
E, em caso de transgressão (que Deus me impeça) de qualquer destas promessas, asseverações e juramentos, submeter-me-ei a todas as penas e dores estabelecidas e promulgadas nos cânones sagrados, e a outras penalidades, gerais e particulares, suscitadas por essas delinquências.
Que Deus me ajude, e também a mim me ajudem estes Evangelhos que tenho em minhas mãos.
Eu, Galileu Galilei, abjurei, jurei, prometi e me curvei, conforme relatado acima.
Em testemunho dessa verdade, assinei com minha própria mão o presente documento de abjuração e recitei-o palavra por palavra em Roma, no Convento de Minerva, em 22 de junho de 1633."


Eppur si muove

Galileu

Diz-se que, ao sair do tribunal, o cientista que se calava teria dito:


- Eppur si muove!
(- Não obstante, ela se move!)


Uma lenda, sem dúvida. Mero adendo fantasioso à narrativa, construído para realçar a intolerância e a atitude grotesca dos que puniram o homem excepcional. Pois, se verdadeira, a insolência teria conduzido Galileu à mesma fogueira de Giordano Bruno.

Condenado à prisão domiciliar perpétua, Galileu faleceu nove anos depois. Nada, porém, pôde deter o triunfo do sistema heliocêntrico, que passou a ser gradativamente aceito por todas as pessoas esclarecidas, até que a ele se rendeu a própria Igreja, no primeiro quarto do século XIX.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

A SÉRIE DE FIBONACCI

A INTRODUÇÃO DO ZERO

O sistema de numeração pelos algarismos indo-arábicos foi uma criação dos indianos, levada ao conhecimento dos árabes por uma missão diplomática que visitou Bagdá em 773 d. C. Por volta de 820, um matemático conhecido como
Al-Khwarizmi (780-850), nascido no Uzbesquistão, escreveu um livro com o nome de "Aritmética", o primeiro texto árabe organizado com os numerais indo-arábicos, mostrando as vantagens do zero e da numeração pela posição dos algarismos.

Subsequentes escritos árabes espalharam o novo tipo de representação numérica, desde as fronteiras da Ásia Central até os países islâmicos do norte da África.

Livro dos ábacos


A novidade revolucionária só chegaria à Europa no início do século XIII. Leonardo Pisano (1170-1250), natural de Pisa, era conhecido como Fibonacci, talvez uma contração de “filho de Bonacio". Na cidade de Bugia, na Argélia, onde seu pai serviu como cônsul, um matemático árabe mostrou a Fibonacci todas as possibilidades do sistema de numeração indo-arábico; entusiasmado com tais maravilhas e novidades, Fibonacci decidiu aprender o que os árabes haviam desenvolvido a respeito, tendo procurado os matemáticos árabes das costas do Mediterrâneo e visitado o Egito, a Síria, a Grécia e a Sicília.


Fibonacci

Fibonacci, que era muito bom matemático,
reuniu tudo que aprendeu com os árabes em um dos livros mais exitosos de todos os tempos, publicado na Itália em 1202, o Liber Abaci (Livro dos Ábacos). Suas primeiras palavras entraram para a história da Matemática:

"
Eis os nove símbolos hindus: 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2 e 1. Com eles, mais o símbolo do zero, que em árabe é chamado de zéfiro, qualquer número pode ser escrito."


Exercícios incluídos no livro mostravam como os algarismos arábicos podiam substituir com vantagem as representações, com letras, dos sistemas hebraico, grego e romano; como se podia fazer cálculo com números inteiros e fracionários, extrair raízes quadradas e cúbicas, correlacionar quantidades por meio da regra de três, calcular lucros e juros, fazer câmbio de moedas e conversão das grandezas conforme as unidades de sua medição.
Atualmente Fibonacci é mais conhecido por haver apresentado no Liber Abaci uma série com a qual pretendia prever o número de coelhos gerados mensalmente a partir de um único casal de coelhos. Afirmava ele que os números acumulados de pares de coelhos seriam, respectivamente, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144, 233, 377, 610, 987 etc, no fim dos meses sucessivos.
 
A série de Fibonacci é exatamente a série proposta para os coelhos, antecedida de 1. A saber:

1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89...

Com efeito, o primeiro número da série é 1; o segundo, também 1; a partir daí cada número é igual à soma dos dois números anteriores.

Segmento áureo  

O quociente de um número da série por seu antecessor converge para 1,618, que permite dividir um segmento de reta em média e extrema razão, obtendo o chamado segmento áureo. O qual está presente nos padrões de flores, nas razões entre partes do corpo humano ou nos ramos de palmeiras, tanto quanto nas concepções arquitetônicas, como nos edifícios do Paternon e da ONU, e até mesmo no comprimento dos braços de uma cruz.
As seções de uma espiral equiangular são inseridas em quadrados sucessivos, cujos lados seguem a série de Fibonacci. A espiral equiangular aparece na forma de certas galáxias, no chifre do carneiro, em muitas conchas marinhas e nas ondas dos surfistas.


Espiral equiangular


Galáxia do Redemoinho ( M51)

Muitas pessoas acreditam que a série de Fibonacci rege as leis que entram em jogo nas reverberações da luz nos espelhos e certos eventos da natureza, como as formas de nuvens.As sementes de girassol organizam-se em dois grupos espiralados, um orientado para a esquerda e outro, para a direita. Os números de espirais nos dois grupos costumam corresponder a dois elementos consecutivos da série de Fibonacci. O mesmo acontece nos cactos, abacaxis e pinhas, sendo frequente que o número de pétalas das flores seja um número de Fibonacci, o que permite supor que haja uma correlação da série com os processos naturais.


VERSUS



Na sua época Fibonacci tornou-se famoso e chegou a ser um protegido do imperador Frederico II, brilhando e sendo aplaudido nas reuniões em que resolvia problemas aritméticos e equações propostas por matemáticos especialmente convidados.
Os matemáticos profissionais, manuseando ábacos, enfrentando Fibonacci, com seu privilegiado sistema de numeração.

sábado, 9 de maio de 2009

A IMAGEM DO UNIVERSO (24/n)

GALILEU GALILEI, O ANTICRISTO (1/2)

A concepção planetária de Copérnico reintroduzia, quase vinte séculos depois, o sistema heliocêntrico de Aristarco, com a Terra e o homem retirados do centro do Universo. Todavia, sua aceitação, em substituição ao sistema geocêntrico, iria requerer longo tempo e acalorados debates, num processo cheio de incompreensões, intolerância e heroísmo.

Galileu

O protagonista nesse processo de aceitação das ideias copernicanas foi Galileu Galilei (1564-1642), um dos personagens mais fascinantes da história da ciência, que vem inspirando inumeráveis textos, biografias, peças de teatro e até um pedido de desculpas por parte da Igreja Católica, em 1992.
Natural de Pisa,
Galileu começou como estudante de medicina, mas graduou-se como professor de matemática. Tinha enorme curiosidade a respeito do mundo, era inquisidor e pouco disposto a aceitar alguma coisa só porque defendida por professores, teólogos ou autoridades.
Conta-se que, ao observar um candelabro durante uma cerimônia religiosa, pôs-se a comparar suas oscilações com as batidas do próprio pulso, o que o levou a descobrir que o período de oscilação de um pêndulo depende unicamente do seu comprimento, sem influência do ângulo ou do peso; a descoberta conduziu à construção do pulsilógio, um instrumento que permitia medir o tempo, tanto quanto a pulsação de um paciente.

Outra de suas invenções foi a bússola militar, na verdade uma régua de cálculo primitiva, que foi logo comercializada, pois servia às operações aritméticas, ao cálculo de juros e à obtenção das derivas e alças dos canhões militares.

Estudo do movimento

Galileu destacou-se inicialmente pelo estudo que fez do movimento, pavimentando muito bem o caminho que Isaac Newton utilizou para chegar à Mecânica Clássica. Descobriu que os corpos caem no vácuo sensivelmente com a mesma velocidade, ao contrário do que sustentava Aristóteles, cuja pressuposição era a de que os corpos pesados cairiam mais depressa. Teve então a ousadia de declarar que Aristóteles "produzira o oposto da verdade". Não foi só. Introduziu a fórmula do movimento uniformemente acelerado, criou o conceito de referencial inercial, estudou o movimento dos projéteis e formulou o princípio da inércia, posteriormente transformado em Primeira Lei de Newton:

“ Um corpo não pode por si só modificar o seu estado de repouso ou de movimento retilíneo uniforme”.

Por desconhecer o princípio da inércia, os antigos imaginavam que, se a Terra se movesse, uma pedra lançada verticalmente para cima haveria de cair longe do ponto de lançamento, "no quintal do vizinho". Não sabiam que por inércia tudo na Terra conserva desta o movimento, em todos os processos e circunstâncias.

Mensageiro das Estrelas


Ao aperfeiçoar a luneta inventada pelo holandês Hans Lippershey, Galileu pôde fazer observações celestes que revolucionaram a astronomia: examinando a Lua, constatou que era cheia de montanhas, abismos e sinuosidades, o que estava em desacordo com a visão aristotélica de que os corpos celestes eram esferas perfeitas; viu também um Sol cheio de manchas, longe de ser perfeito, e quatro luas movimentando-se em torno de Júpiter, ou seja, um desconcertante caso de astros que não giravam em torno da Terra.
Estas descobertas, publicadas em 1610, num livrinho de 24 páginas, “Sidereus Nuncius” (“Mensageiro das Estrelas”), começaram a desiquilibrar o jogo em favor de Copérnico. Para o historiador J. R. Ravetz, foi esse o maior clássico de ciência popular de todos os tempos, imediatamente traduzido para vários idiomas, incluindo-se o chinês, numa versão preparada por um padre jesuíta.

Galileu percebeu depois as fases de Vênus, semelhantes às da Lua, conforme previsto por Copérnico, e, mais, os anéis de Saturno e vastas aglomerações estelares, arrolando 80 estrelas a mais do que o habitual no agrupamento estelar das Plêiades de Órion. Suas observações demonstravam sempre que o modelo centrado na Terra não podia mais ser defendido.
Não obstante a popularidade de Galileu, a maioria dos astrônomos e intelectuais reagiu com ceticismo ou indiferença.
Eles tinham passado a vida aceitando a solução geocêntrica e não estavam dispostos a admitir que haviam acreditado e laborado no erro.
Os satélites de Júpiter implodiam o aristotelismo e por isso suscitaram apaixonados debates entre copernicanos e aristotelistas. Um colega da Universidade de Pádua, César Cremonini, recusou-se a olhar pela luneta, e um astrônomo do Colégio Romano, padre Cristóvão Clavius, afirmou que as luas de Júpiter "eram motivo para riso e que seria necessário fazer uma luneta que as fabricasse, para depois tentar vê-las." Outro astrônomo, Martin Horky, escreveu uma carta para Kepler, na qual zombava de Galileu, "com aquela luneta que lhe permite ver quatro luas imaginárias!"

Io, Europa, Ganimedes e Calisto, satélites de Júpiter

Aos que a ele se opunham com argumentos religiosos e textos bíblicos, Galileu respondia que os religiosos deveriam restringir-se ao mundo espiritual, deixando a ciência para os cientistas.

- A Escritura Sagrada destina-se a ensinar como chegar ao Céu e não para explicar como o céu funciona.

Kepler apoiou Galileu incondicionalmente e acabou conseguindo uma luneta, o que lhe permitiu comprovar pessoalmente que os satélites de Júpiter realmente existiam.
(continua)