quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

MARIGHELLA, O GUERRILHEIRO POETA

Para além do seu Manual do Guerrilheiro Urbano e de textos políticos diversos, Carlos Marighella deixou também uma obra poética, reunida no livro Rondó da Liberdade. Há nele poemas de muito amor e beleza:

Liberdade

Não ficarei tão só no campo da arte,
e, ânimo firme, sobranceiro e forte,

tudo farei por ti para exaltar-te,
serenamente, alheio à própria sorte.

Para que eu possa um dia contemplar-te

dominadora, em férvido transporte,
direi que és bela e pura em toda parte,
por maior risco em que essa audácia importe.

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma,
que não exista força humana alguma

que esta paixão embriagadora dome.

E que eu por ti, se torturado for,

possa feliz, indiferente à dor,

morrer sorrindo a murmurar teu nome.


(São Paulo, Presídio Especial, 1939)


Provas científicas em versos


No ginásio

Em 1929, Marighella, então com 17 anos, desenvolveu em versos uma questão de Física proposta em uma prova do Ginásio da Bahia. Consta que se tratou de ponto sorteado,

-
“Catóptica, leis de reflexão e sua demonstração, espelhos, construções de imagens e equações catópticas” -

o que confere caráter de improviso à referida poesia, da qual são os versos a seguir:

(...)

Doutor, a sério falo, me permita em versos rabiscar a prova escrita.
Espelho é a superfície que produz, quando polida, a reflexão da luz.
Há nos espelhos dois casos a considerar, quando a imagem se formar:

Caso primeiro: um ponto é que se tem; ao segundo, um objeto é que convém.

Seja a figura abaixo que se vê. O espelho seja a linha Beta-Cê.

O ponto F um ponto dado seja.
Como raio incidente, R se veja.
O raio refletido vem depois

E o raio luminoso ao ponto 2.

Foi traçada em seguida uma normal,
O ângulo 1 de incidência a r igual.
No prolongamento, um luminoso raio

Que o refletido encontra de soslaio.

Dois triângulos então o espelho faz,

Retângulos os dois, ambos iguais.
Iguais porque um cateto têm comum,
,
Dois ângulos iguais formando um.

(...)

Na faculdade

É também de Carlos Marighella uma prova em versos, de 1931, na Escola Politécnica da Bahia, desenvolvendo a seguinte questão de Química:

“Propriedades do hidrogênio e sua preparação no laboratório e na indústria”.

Fusão de núcleos de hidrogênio

Dessa prova são os versos a seguir:


(...)

De leveza no peso são capazes
Diversos elementos, vários gases,
O hidrogênio, porém, é um gás que deve
ter destaque por ser o gás mais leve.
Combina-se com vários metaloides,
Com todos, aliás, e os sais aloides
Provêm de ácidos por aquele gás

Formados, reunindo-se aos demais.

(...)

Carlos Marighella (1911 — 1969)

2 comentários:

querência disse...

Meu caríiissimo Remo, és, de fato,surpreendente, além de generoso e gentil.Querias então fazer-me "uma visita" anônimamente!
Onde já se viu? por quê?Só pq querias dar-me uma contribuição,corrigindo a autoria de uma marchinha?Só tenho a agradecer-te por isto.O crédito foi dado por uma emissora de rádio daqui e, por ser muito respeitada,não me dei ao trabalho de checá-lo.Negligência minha.
Em relação à tua postagem sobre Marighela, achei muito boa.Confesso que não sabia de seus dotes poéticos-literários.Muito bom.Ele era um homem muito inteligente, correto e acreditava no que fazia.Não foi por acaso que foi tão perseguido e teve um final tão trágico.Acho que ele é pouquíssimo conhecido pela maioria dos brasileiros.Se me permitires, gostaria de oportunamente, divulgar as poesias que publicaste.De qualquer maneira, farei uma pesquisa para ver se encontro mais alguma coisa dele. Um afetuoso abraço.

Remo Mannarino disse...

Oi, Cirandeira

Queria manter-me anônimo com o intuito de não parecer que estava dando uma de sabichão. Eu sabia, muito por acaso, que a música era da década de 1950, cantada pelos Quatro Ases e Um Coringa. Recordações da minha infância profunda.
Pode divulgar como quiser.
Obrigado pela generosidade das suas palavras.