MÁRTIR DA CIÊNCIA
Por que Deus, sendo infinito e todo-poderoso, não criaria um mundo infinito, com outros sóis e outras humanidades? Eis o que costumava perguntar Giordano Bruno (1548-1600), filósofo, astrônomo e matemático italiano, antes de afirmar sua crença de que o Sol seria apenas uma estrela no meio de uma infinidade de estrelas.
Nas suas concepções, o Universo, assim infinito, seria povoado por milhares de sistemas solares, integrados por planetas, muitos dos quais com vida inteligente.
- Deus e o Universo são uma única e mesma coisa. Tudo é Deus, e Deus está em todas as coisas.
A ambição de Bruno era construir um embasamento filosófico que se coadunasse com as grandes descobertas científicas de sua época. Por sua intuição extraordinária, estava séculos adiante de seu tempo e é considerado um pioneiro da filosofia moderna, tendo influenciado Descartes, Espinosa e Leibniz.
Giordano Bruno rejeitou a teoria geocêntrica e pelas suas ideias avançadas colocou-se até à frente da teoria heliocêntrica de Copérnico, na qual o Universo ainda se considerava limitado por uma esfera de estrelas fixas, como afirmado vinte séculos antes, de então, por Aristóteles. Para Giordano, que deu aulas em universidades da Itália, França, Suíça e Inglaterra, as ideias de Aristóteles deveriam ser abandonadas sempre que fossem incompatíveis com a realidade observada. O mesmo pensamento que trinta anos depois colocou Galileu no centro da maior controvérsia havida entre religiosos e cientistas, cujo desfecho foi paradoxal, pois o derrotado Galileu saiu-se amplamente vitorioso perante a humanidade.
Quando o advertiam da incompatibilidade de suas ideias com o que se preconizava nas Escrituras, Giordano Bruno respondia que os textos religiosos não eram referências infalíveis ou obrigatórias, tanto que neles se omitiam completamente as Américas e seus povos, cuja existência dizia ser incompatível com o relato bíblico da Arca de Noé. Ou seja, a Biblia deveria ser observada por seus ensinamentos religiosos, não por suas declarações sobre Astronomia.
Por essa ousadia do pensamento, Giordano Bruno teve de pagar um preço elevado: foi feito prisioneiro do Santo Ofício e levado a julgamento perante o Tribunal da Inquisição. Em sua defesa, Giordano Bruno apelou para a sua condição de filósofo, tal como Aristóles e Platão, cujas ideias nem sempre coincidiam com o que se continha nos textos sagrados.
O cardeal Roberto Bellarmino, consultor do Santo Ofício, propôs-lhe que se retratasse de suas ideias, para, desse modo, escapar da condenação. Giordano Bruno declarou que não tinha nada de que retratar-se e que nem sabia de que se esperava que ele se retratasse. O resultado foi sua condenação à morte, na fogueira.
Alguns dias antes da execução, Giordano Bruno teria dito aos seus carrascos:
- Essa sentença, pronunciada em nome do Deus da misericórdia, assusta mais a vocês do que a mim!
Queimado vivo, aos 52 anos de idade, em Roma, no Campo das Flores, no ano de 1600, Giordano Bruno tornou-se um mártir do livre-pensamento. Morreu sem olhar o crucifixo colocado à sua frente para infligir-lhe uma derradeira humilhação. Com ele, entretanto, a filosofia começaria a se libertar da religião, favorecendo o nascimento da ciência moderna.
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