quarta-feira, 27 de maio de 2009

ACORDO ORTOGRÁFICO

Confusão

O Acordo Ortográfico parece que vai exigir mais trabalho do que imaginado inicialmente, pois
, para dirimir dúvidas quanto ao uso do hífen, teremos de ir frequentemente ao dicionário. Pelo andar da carruagem, nem os especialistas (ortógrafos? lexicógrafos?) parecem estar se entendendo sobre as novas regras, apontando várias lacunas, contradições e inconsistências no texto acordado. Exegetas experimentados nas questões do idioma haverão de decifrar se devemos escrever "jogo treino" ou "jogo-treino", "francoatirador", "franco atirador" ou "franco-atirador", "lava rápido", "lavarrápido" ou "lava-rápido". Em tempo, "mega-sena" ou "megassena", "bem mandado" ou "bem-mandado"?

- Água-de-coco ou água de coco?

- Em que as pessoas devem fundamentar-se nessa questão do hífen?

- Na Base XV do Acordo, que tem a seguinte redação:

"Emprega-se o hífen nas palavras compostas por justaposição que não contêm formas de ligação e cujos elementos de natureza nominal, adjetival, numeral ou verbal, constituem uma unidade sintagmática e semântica e mantêm acento próprio, podendo dar-se o caso de o primeiro elemento estar reduzido. Exemplos: conta-gotas, finca-pé, guarda-chuva.
Certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente: girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedismo, etc.
"

"Pontapé", mas "finca-pé"

- Não entendi, mas gostei muito do "etc", no final... Acho até que o texto faz confusão entre justaposição e aglutinação, sei lá. Mais que isso, tenho para mim que as expressões "certos compostos" e "em certa medida" devem ajudar muito o entendimento dos que estiverem entendendo o resto. Mas, vem cá,"finca-pé" e "mandachuva" seguem regras diferentes de hifenação? Outra coisa: pela regra não devia ser "justa-posição", em lugar de "justaposição"?

- Para transitar com segurança nessa questão, o usuário do idioma deverá verificar, em cada caso, se está diante de um encadeamento vocabular ou de uma palavra composta
. Feita a verificação, saberá grafar corretamente:

"paraquedas", mas "para-choque";

"guarda-chuva", mas "mandachuva";

"Porto Alegre", mas "porto-alegrense".


- É assim, é?

- Distinguir sempre se não se trata de unidade fraseológica constitutiva de lexia nominalizada.

- Caramba!

No restaurante

Bife malpassado, sem hífen

- Garçom, este bife está malpassado?

- Não senhor, está bem-passado, com hífen.


Na loja de perfumes

Águas-de-colônias, cheias de hífens

- Vocês têm água de cheiro?

- Não, pois não vendemos nada que não seja hifenado. Temos água-de-colônia.


Não e quase
Sistema não linear

- Usa-se o hífen depois de "não" e "quase", quando atuando como prefixos, como em "equações não lineares" e "quase arquiteto"?

- Não.


- Não, mesmo?

- Bem, quando houver necessidade de ênfase estilística, pode-se usar o hífen nestes e em todos os outros casos nos quais o uso permitir. Entendeu?

- Não, não entendi.
- Acho que sou quase-burro, com muita ênfase.

Uma tentativa nos Estados Unidos

Uma reformulação ortográfica implica, no ato mesmo da sua imposição, a maculação irreversível de todas as bibliotecas construídas de acordo com as regras anteriores da língua, com graves consequências econômicas, e só por isso haveria de ser um recurso extremo e de caráter definitivo. Essa a razão pela qual um acordo desse tipo vem sendo recusado, desde muitos séculos, pelos países de língua inglesa e de língua francesa, para citar duas das línguas mais importantes e, não obstante, mais cheias de problemas.
Nem o presidente Theodore Roosevelt, com sua autoridade de intelectual e líder carismático, conseguiu bancar uma reforma desse tipo nos Estados Unidos. Uma comissão chamada de Simplified Spelling Board (da qual fazia parte Mark Twain) organizou uma lista de 300 palavras inglesas que deveriam ser imediatamente escritas de maneira simplificada, recomendando que outras modificações fossem introduzidas no decorrer do tempo. Essa iniciativa desonerava a assoberbadíssima língua inglesa, e alguns aceitaram a lista imediatamente, até mesmo algumas escolas.

- "Enough" seria substituída por "enuf", "phantasy" por "fantasy", "night" por "nite", "although" por "altho", "catalogue" por "catalog", e assim por diante.

O maior entusiasta da simplificação foi Theodore Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, que enviou uma ordem ao United States Government Printing Office (Departamento de Imprensa do Governo), em 27 de agosto de 1906, determinando que os documentos oficiais passassem a adotar a lista das 300 palavras modificadas.


Rondon, amigo de Theodore Roosevelt

Houve, porém, forte reação popular, pois os que aceitavam a simplificação eram na verdade minoria. Os jornais passaram a fazer piadas sobre a reforma, que foi rejeitada pelo Congresso em 13 de dezembro de 1906 e a seguir pela Suprema Corte dos Estados Unidos.

Um comentário:

querência disse...

Mama mia, Remo!
Cruzes! Ai Jisus! Que essa prosopeia(com acento, ou sem assento para sentar-se sobre esse ditongo?)parafernalizada nos deixa mais loucos do que já somos.Num país em que pouco ou quase nada se lê, em que 35% são apenas semi-alfabetizados,"adjetival","unidade sintagmática e semântica","hifenação","lexia nominalizada", soam como palavrões!
A nossa gramática já era recheada de contraições, de regras confusas,
imprecisas, agora então!?
Esse "acordo" surgiu mais por uma questão política,do que por qualquer outra coisa, tendo Portugal como "cabeça", afim de impor-se como representante da língua portuguesa face às, outras que dominam o planeta:Inglês,Espanhol e Francês,que por sinal, vem perdendo terreno a cada dia.
Por enquanto,ainda temos um tempinho para nos adaptarmos,porque
o prazo para entrar em vigor, pra valer mesmo, é até 2011/12, salvo engano meu.
Enquanto isso, vamos navegando, divagando,devagar, devagarzinho...
Obrigada pelo apoio carinhoso que
me tens dado.Um grande abraço.
E venha aqui também, nesta "outra
sala"...