quarta-feira, 16 de julho de 2008

TEORIA E PRÁTICA

O problema

Imagine você discutindo o negócio da sua vida. No lado antagônico da mesa, representa a outra parte um hábil e qualificado negociador internacional, Alexander O. Tracy, que estudou no MIT, foi empresário do Frank Sinatra, negociou a libertação dos prisioneiros no Iraque e ganha, da Sunshine, 79 mil dólares por mês, fora os bônus de balanço, que multiplicam muito sua remuneração nominal.

Alexander O. Tracy

Sem nenhum prefácio, O. Tracy deixa claro para você que a Sunshine Corporation não aceita menos de 53 por cento da receita bruta, conforme circular em suas mãos, tendo em vista os problemas com os contratos de “subprime”, a alta da taxa de juros na China, a situação do Oriente Médio, tão instável, e a escalada dos preços internacionais dos aços planos. Mr. Tracy precisa fechar o negócio com urgência, pois viajará no dia seguinte para Nova York, onde tem um encontro social com Alberto de Mônaco e um contrato a discutir com o presidente da FIFA.

- Há, no logaritmo do aço, muita característica e pouca mantissa. Seu preço subiu 175 por cento, de dezembro de 2005 a dezembro de 2007, sem contar as oscilações do câmbio. E como ficam as pesquisas, a capacidade de investimento e o "dividend yield" dos nossos acionistas?

- Tudo bem, não se pode esquecer dos logaritmos. Mas tem de ser 53 por cento?

- Já se fala em 74 por cento, nas futuras "joint-ventures", se não for mais!


Que devo fazer?, perguntará você, que tem a responsabilidade de conceder 30 por cento da receita bruta, não mais.

Na teoria

"Que devo fazer?" é uma excelente pergunta, o que mostra que você está no caminho certo, mas saiba, desde já, que negociar é a arte de acertar um negócio com competência.

- Entendo, competência...

Karl Friedrich Gauss
- Competência, sim, preparo, poligrafia. Você é capaz de enunciar os postulados de Euclides? Calcular a esperança matemática dos projetos de risco? Redigir em alemão e iídiche, discorrer sobre os Grandes Lagos e as ilhas de Kiribati e traçar isópacas? Sabe de cor os afluentes da margem esquerda do Rio Solimões, os teoremas de Green, Stokes e Gauss, distingue kwanza de metical, sabe programar em linguagem de máquina e está suficientemente habilitado para dar uma aula dentro de cinco minutos sobre as três conjugações do latim vulgar na Península Ibérica?

- Bem...

- Se, de fato, sabe todas essas coisas, meus parabéns. Calma, todavia, pois, além de competente, você tem de ser flexível, criativo, educado e seguro de si. Por quê? Não se esqueça que do outro lado da mesa está Mr. O. Tracy, ou seja, alguém com uma competência equivalente à sua, e o encontro de competências pode gerar um impasse inconveniente.
Inconvenientíssimo!

- Ele diz 53 por cento, e eu contraproponho 30 por cento, mas com toda a educação.

- Para superar o impasse, você terá de mostrar flexibilidade, criatividade e controle psicológico. Não ceder mais que o necessário, nem frustrar o negócio, pois é essencial preservar tanto o contrato quanto o interesse da parte que você representa, sem melindrar a Sunshine, nem Mr. O. Tracy, que, além de tudo, é um profissional respeitável. Saber negociar é, pois, fundamental: se um raio cair na sua cabeça, esteja certo de que não negociou adequadamente o seu lugar na chuva...Entendeu?
Na cabeça...
- Creio que sim.

- Ótimo, pois será chamado a negociar daqui a alguns dias.


Na prática

Quando tocou a vez do quinto postulado, declarei que por um ponto do plano fora de uma reta pode-se traçar uma paralela a essa reta, e somente uma.


- Como assim?, estranhou Mr. Henry Power. Por um ponto exterior a uma reta, não podemos traçar nenhuma paralela a esta reta, na geometria de Riemann, ou podemos traçar uma infinidade de paralelas a essa reta, na geometria de Lobachevski.

Cachimbo de Mr. Power

Quanto aos afluentes do Solimões, eu sabia o Javari, o Jutaí, o Juruá, o Purus e o Japurá.

- Você se esqueceu do Içá, disse-me Mr. Power.
Elsa Martinelli
Foi então que pensei: estou num filme do Godard ou num enredo do Jorge Luís Borges, quem sabe num safári com a Elsa Martinelli, e não numa roda de negociação. Além disso, nada sei sobre o teorema de Green, e esse cara vai me impingir 53 por cento, ao perceber que sou um otário, de uniforme e carteirinha. Ora se vai. Fui me levantando, meio sem graça, escafedendo-me porta afora.

- Adeus, para nunca mais, que preciso me recolher ao futuro. Good afternoon.

Um comentário:

Anônimo disse...

Neste capítulo no final do livro "Teoria e Prática", mostra o caminho narrado pelo autor, como passou a sumariar e sintetisar sua vida, a fim de que se tornasse fácil a escolha; o melhor que correspondesse às suas aspirações pessoais.
Adquiriu mais de pronto a experiência necessária, fruto do seu trabalho que as primeiras travessias lhe impôs; aportando em virtude do seu mérito pelo seu esforço,às atividades de desenvolver os recursos de imaginação que precisou empregar para abrir caminhos que aumentaram os seus conhecimentos e desenvolveram sua inteligência, ajudando nosso Brasil.
_Êta Mineiro!
No capítulo inovando e revivendo como Negociador e Professor de Economia, e de Projetos de Petróleo e Gás; empreendeu um jogo antagônico, onde muitas vezes não se entendiam cada um do seu lado, mas com a sua perspicácia sempre conseguiu o melhor!
Chegando enfim a aposentadoria com uma grande bagagem, fica sempre a pergunta:
_Poderia ter feito muito mais, mas o tempo passou e agora?
Com este sentimento que dá em todos que param, fica o mérito, os louvores!
Não devemos desmerecer o que fizemos. Seu valor como indivíduo único ficou registrado!
Preciso me recolher no futuro:
São os sentimentos de quem sabe que nada do que adquiriu em saber estará perdido.
Antevendo a vida futura, dilata-se-lhe o círculo das idéias.
O povir lhe pertence: a crença na vida futura é pois elemento de progresso, de razão, de perseverança assinalando um objetivo, um incentivo para um futuro cada vez melhor!
Good night!
Maria das Graças.