- Negociar, sim, mas este livro aqui é um tratado de cinismo, disse Ferdinando Olivares.
- Lendo sobre negociações até nos momentos de lazer, isso é que é deformação profissional.
- Não é para menos. Na nossa vida particular e doméstica, negociamos a cada instante, seja para comprar um apartamento, discutir um empréstimo, escolher um programa, um restaurante ou nosso lugar no avião. Negociamos nosso trajeto, com o motorista de táxi, e o mês das férias, com o nosso chefe. No lado profissional, a necessidade de negociar é ainda maior, seja nas aquisições de materiais, nas reuniões com outros profissionais, nas tratativas com os clientes e prestadores de serviços ou nas discussões de contratos.
- E esse livro?
- "Negociar e Vencer”, de Nicolau Júnior. Não é curioso, Roberta?
- Como assim, curioso?
- Maquiavel era também Nicolau, só isso... Pois o livro ensina que negociar é manipular e enganar a outra parte. Não agüentei prosseguir, depois de dois capítulos. O primeiro trata dos “aforismos do negociador”, invocando até Sun Tzu, e o segundo, da “arte de refutar” com frases feitas e muito cinismo. Um autêntico manual para jogador de pôquer, que serve também para discutir futebol e para as provocações entre parlamentares. Quer ver?
Aforismos do negociador, por Nicolau Júnior
Uns fazem as coisas acontecerem, mas para quase todos as coisas simplesmente acontecem.
Ai dos vencidos!, disse o general Breno aos romanos, que reclamavam dos ônus de guerra.
Saiba a hora em que deve cantarolar.
O outro é o outro, e nunca se sabe do que é capaz.
Comece fazendo afirmações amenas e, se for censurar ou criticar, faça-o indiretamente.
Chegando a um impasse, mude; depois de mudar, triunfe.
Improvável é infinitamente menos que impossível.
Mentir, só se necessário.
Onde há vontade forte, não há dificuldades intransponíveis.
Fins nobres justificam meios heterodoxos e às vezes os consagram.
Cinco caminhos de Sun Tzu
(1) Toda arte militar baseia-se no ardil.Sun Tzu
(2) Quando capaz, finge incapacidade.
(3) Quando perto, dá mostras de que estás longe; quando longe, de que estás perto.
(4) Quando o inimigo for forte, evita-o.
(5) Prepara uma isca para o inimigo, a fim de ludibriá-lo, e fisga-o.
A arte de refutar, por Nicolau Júnior
Se você quiser refutar o oponente, diga de:uma tese, que é obscura;
uma narração, que é desinteressante;
uma descrição, que a ordem seguida é ilógica;
uma classificação, que há excesso de divisões e de quadros sinóticos;
uma analogia, que é muito sugestiva, mas inconsistente;
uma indução, que se trata de uma generalização audaciosa, mas indevida;
uma dedução, que contradiz todas as leis da inteligência;
uma racionalização, que deforma a realidade;
uma hipótese, que, com tantos “ses”, meteríamos o Himalaia numa lata de salsicha.
Se o oponente apresentou fatos, refute-os com uma das pérolas a seguir:
esses fatos são atípicos;
esses fatos não são claros;
esses fatos são muito antigos;
esses fatos são muito recentes;
esses fatos não dão a idéia do conjunto;
esses fatos não dão idéia das partes;
esses fatos não têm relação de causa e efeito;
esses fatos apontam para os efeitos, mas não dizem sobre a causa;
esses fatos revelam as causas, mas os efeitos não são claros;
esses fatos são muito escassos;
esses fatos são superabundantes;
ora, os fatos!
- E os fatos que você ignorou ?
O caminho da competência
- Qual, então, a alternativa à manipulação, se temos de viver negociando em todos os momentos?
- A competência. O negociador deve saber tudo sobre o assunto que está sendo negociado, não decidindo nada sem ter todas as informações relevantes. Por exemplo, é arriscado comprar um apartamento sem saber os preços de mercado, como arriscado e desnecessário ficar improvisando soluções para questões para as quais há cláusulas contratuais "de mercado", resolvidas em contratos anteriores. Competência se obtém com informação.
- Um trabalho a mais, esse de ser competente para negociar.
- O preço que se paga para não ser enganado. Fundamental é conhecer todas as implicações da negociação, como especificações, prazos, condições de pagamento, taxas de juros, garantias e outras questões envolvidas. Tentar encontrar uma solução equânime, com base nos preços de mercado e nas cláusulas de mercado, não aceitando condições sem estudá-las, nem prazos enganosamente curtos ("phony deadlines") para decidir sobre os assuntos da negociação. A competência pressupõe rigorosa preparação por parte do negociador: ninguém deve sentar-se à mesa como o sabichão que decide tudo de sopetão, ex-abrupto, pois as soluções contratuais nunca podem ser improvisadas.
- A não ser pelas vítimas do Nicolau Júnior.
Roberta e Ferdinando
- Você entendeu a questão. Vamos ver o filme da Claire Danes?
- Prefiro o do Antonio Banderas.
- O filme que estou sugerindo baseou-se num conto do Steve Martin e é protagonizado por Claire Danes, por Jason Schwartzman e pelo próprio Steve Martin. Dirigido por Anand Tucker, o tailandês que fez "Hilary e Jackie". Só escolhi esse filme porque você gostou muito do Steve Martin em "Cliente morto não paga" e "Os safados", lembra-se?
- Tudo bem, vamos ver a Claire Danes.
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