A GRANDE TACADA
Meu principal assistente na WED era um jovem advogado de nome Yorick, que me ajudava na elaboração dos contratos, pois tinha boa redação e falava vários idiomas. Um dia, porém, alguém convenceu-o de que havia uma maneira fácil de ganhar dinheiro. Foi uma história curiosa e cheia de consequências.
- Digamos que você venda uma quantidade de ações da Petrobras por 100, comprometendo-se a entregá-las apenas numa data futura; depois, a ação caindo, antes da data futura acordada você recompra igual quantidade por 40, por exemplo; como você vendeu e comprou a mesma posição, está zerado e não precisa entregar nada. Um jogo, de créditos e débitos, onde não entram ações, que estas não interessam, mas apenas suas cotações. Mas há um troco de 60, entendeu?
- Troco de 60?
- O qual é tutu, generoso e fecundo, no bolso da criança!
- Mas as ações da Petrobras vão cair?
- Sem nenhuma dúvida, Yorick, pois sei de fonte limpa que o balanço anual, no fim do mês, virá muito aquém da expectativa do mercado. Balanço ruim, as cotações correrão para baixo, uma tacada de mestre!
Yorick não tinha nenhuma familiaridade com esses torneios vitoriosos da Bolsa de Valores, mas compreendeu a operação. Ouvira falar vagamente de mercado futuro e de gente que ganhou fortunas com esse tipo de especulação e acabou acreditando que aquela era a sua vez. Se tinha uma informação privilegiada, era usá-la para ganhar muito dinheiro.
- Por que você vai se meter nisso?
- Porque também sou filho de Deus.
Reuniu todas as suas disponibilidades, além de recorrer a empréstimos bancários, para fazer a margem, que era a garantia exigida na operação. Foi assim que procurou uma corretora de valores e negociou os maiores lotes que lhe permitiam seus recursos, pois, se lhe cabia entrar nesse negócio, que fosse de maneira decisiva. Ganhar o dinheiro da minha vida, pensou, e casar com a Valentina, pois não me recusará, como antes, quando o cidadão aqui não era um milionário.
- Ela me disse que jamais se casará com um pretendente que tem de trabalhar para sobreviver.
Restou-lhe, depois, aguardar, e Yorick foi acompanhando, ansioso, a evolução do mercado pelos jornais. As ações da Petrobras, como previsto, começaram a cair devagarinho, que a informação sub-reptícia vai se alastrando, insidiosa, de modo que os avisados, cada vez em maior número, vão se livrando do papel. Se há muita oferta, os preços desabam, eis uma lei inexorável, presente em todos os mercados, seja de ações, seja de pés de alface ou de pinguins de geladeira.
- So far, so good, pensou Yorick, satisfeito.
Quando afinal o balanço fosse publicado e a desvalorização chegasse ao máximo, recompraria os lotes vendidos para auferir o lucro da sua vida.
A geometria
A geometria, que é anterior ao homem, nos mostra que o quadrado de uma hipotenusa é soma de dois quadrados, sempre, sempre, antes do Big Bang, na época de Empédocles de Agrigento, nos dias atuais e eternidade adentro. Uma propriedade assegurada por catetos submissos e providenciais, cujos quadrados somam o resultado desejado, qualquer que seja a hipotenusa, não importa se carismática, excitada ou oligofrênica.
- Por que se pode afirmar isso?
- Porque a geometria garantidamente não falha!
- E o resto?
- Bem, o resto é o resto, como a capivara, que não tem nenhuma garantia.
Pois é, o inesperado aconteceu. Uma semana antes da publicação do balanço, veio o anúncio inesperado de uma descoberta de petróleo na Bacia de Campos, triplicando as reservas nacionais de hidrocarbonetos. As ações da Petrobras, ao invés de continuar caindo, dispararam na Bolsa de São Paulo, tanto quanto em Wall Street e Buenos Aires. Nunca tinha havido uma escalada tão espetacular nas cotações do papel. Ou seja, no caso do Yorick a tacada funcionou ao contrário. Viu-se obrigado a recomprar os lotes comprometidos pelo dobro do crédito gerado na operação, realizando, no frigir dos ovos, um prejuízo de 112,5 por cento, para zerar sua posição. Por isso tinham exigido todas aquelas garantias! Perdeu na empreitada tudo o que possuía, foi demitido a pedido, para receber indenizações trabalhistas, e desapareceu para sempre.
Sofia, a mulher que voou
Sem Yorick, lembro-me de ter admitido uma assistente, Sofia, que falava inglês fluentemente, sabia tudo de informática e era admirada por sua beleza excepcional. Nela enxergava apenas a excelente profissional, pois amava Cecília, que me bastava, e não tinha olhos para nenhuma outra mulher. A assistente mostrou-se de grande valia na redação dos textos e na formulação de cláusulas alternativas, sugerindo caminhos inovadores, que serviam ao êxito das negociações. Juntando-se a isto sua rara beleza, não era sem razão o sucesso que fazia. Fui percebendo que alguns negociadores estrangeiros visitavam-nos mais vezes que o necessário, sob pretexto de esclarecer cláusulas contratuais, só para ter contato com ela. Um deles, Chuck Birdwise, chegou a confidenciar para um geólogo da WED que se casaria com ela, se ela assim quisesse.
- Isso foi o bastante. Sofia pediu demissão da WED, casou-se com o estrangeiro e mudou-se para Nova York.
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
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